Nas primeiras horas da manhã de quinta-feira, Ana Claudia Almeida, 47 anos, chegou ao Rio, vindo de Belém do Pará, pela segunda vez em cinco anos, desde que seu filho havia se mudado para a cidade. Ele deixou seu estado natal em fuga do sistema penitenciário, após uma saída temporária para visitar a família, e ela, agora, veio levar o corpo de Arlan João de Almeida de volta para casa. Em meio à aflição de ter perdido seu filho, Ana pegou dinheiro emprestado com o irmão para custear a passagem de avião, e teve que contar com a compreensão de sua supervisora, na escola pública em que trabalha como merendeira, para abonar os dias de ausência.
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— Vim pedindo dinheiro emprestado, só para ver meu filho, levar ele de volta para casa. Paguei uns R$ 3.500 de passagem. Deixei meu trabalho, a sorte é que tenho uma chefe que entende a minha dor — contou ela.
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Na porta do IML, ela confessou torcer para não ter que embarcar de volta com o caixão fechado, sem poder antes ver o filho, que tinha 30 anos — e faria 31 na próxima segunda-feira.
— Parece que vão me entregar uma encomenda. Estou vivendo uma segunda perda. E, olha, não passo a mão na cabeça dele, nunca passei. Ele é errado, estava fazendo coisa errada. Sou trabalhadora, nunca peguei as coisas de ninguém. Não queria essa vida para ele. É muito triste.
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Ana Claudia teve quatro filhos, duas meninas e dois meninos. O mais velho e o mais novo morreram após envolvimento com o crime.
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— Quando descobri (o envolvimento deles) foi uma tristeza. Conversava muito com eles, dizia que a gente não precisa disso pra sobreviver. Mas a mãe é sempre a última a saber. — O que mais me entristece é que ele morreu para defender o crime, não foi pela mãe, por um irmão ou pelos filhos. Ele estava aqui foragido, e se manteve lá (no Complexo da Penha) para não ser preso.
