‘Um grande absurdo’, diz advogada do homem solto após 15 anos preso por crime da 113 Sul

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Após ter a soltura imediata determinada pela Sexta Turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), Francisco Mairlon Barros Aguiar, de 37 anos, ainda pode voltar a ser julgado por suposto envolvimento no ‘Crime da 113 Sul’ caso o Ministério Público (MP) do Distrito Federal, responsável pela acusação, embargue a decisão ou entre com um recurso para que o julgamento seja levado ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Em 2010, Francisco foi apontado como um dos responsáveis pelo homicídio do advogado e ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) José Guilherme Villela, sua esposa, Maria Villela, e a empregada da família, Francisca Nascimento da Silva. Ele deixou a penitenciária da Papuda, em Brasília (DF), nesta terça-feira (14), após passar mais de 15 anos em reclusão.

Segundo a advogada Luiza Ferreira, do Innocence Project, organização dedicada a reverter condenações criminais consideradas injustas e que assumiu a defesa de Francisco em 2023, a possibilidade de que o MP deseje retomar o processo é real, mesmo que seja considerada baixa.

— No caso da Adriana, o MP já mostrou sua irresignação quanto à anulação, o que por enquanto não aconteceu com o Francisco — afirma Ferreira em entrevista para O GLOBO. — Me parece que o Ministério Público talvez tenha entendido que, no que diz respeito à condenação do Francisco, é tudo um grande absurdo.

Mairlon havia sido condenado a 47 anos de prisão por homicídio e furto qualificado, com base em confissões dadas à polícia que jamais foram confirmadas em juízo. Para o relator do recurso apresentado no STJ, o ministro Sebastião Reis Júnior, a condenação foi sustentada exclusivamente por elementos da fase extrajudicial, o que fere os princípios do contraditório e da ampla defesa.

“É inadmissível que, no Estado Democrático de Direito, um acusado seja pronunciado e condenado por um tribunal de juízes leigos, apenas com base em elementos de informação da fase extrajudicial, dissonantes da prova produzida em juízo e sob o crivo do contraditório”, afirmou o ministro.

Segundo o STJ, as confissões obtidas durante o inquérito policial foram desmentidas durante a fase judicial, tanto por Mairlon quanto por outros dois réus. Para os ministros, não havia provas materiais ligando Mairlon à cena do crime, e os depoimentos em juízo dos próprios corréus o inocentavam.

O caso foi classificado como “erro judiciário gravíssimo” pelos integrantes da Sexta Turma. “Me espantou essa utilização de elementos meramente informativos, levantados na fase administrativa, serem transformados em provas sem qualquer cotejamento com os demais elementos”, disse o ministro Carlos Pires Brandão. Já o ministro Og Fernandes declarou: “Todos aqui temos um único desejo, a verdade. […] E parece que essa verdade assim obtida, pelo que vi, é falsa. Não convence.”

Em 2024, uma das principais reviravoltas no caso ocorreu com a retratação de Paulo Cardoso Santana, também condenado como executor. Ele confessou à ONG que havia mentido ao envolver Mairlon, alegando tortura policial:

“Francisco Mairlon não tem nada a ver com isso aí. Ele é inocente, entendeu? Ele é inocente. Ele foi levado em um processo a pagar por um crime que ele não cometeu. […] Eles torturaram, eles fizeram tudo”, declarou Santana.

Além de Paulo Santana, Leonardo Campos Alves, ex-porteiro do prédio e apontado como mentor da ação criminosa, também foi condenado. Os dois seguem presos. Adriana Villela, filha do casal assassinado, havia sido condenada como mandante, mas sua sentença também foi anulada pelo STJ em setembro, por cerceamento de defesa.

Francisco Mairlon foi preso em 2010, quando morava no município de Novo Gama (GO). Na época, sua esposa estava grávida de oito meses e ele trabalhava no comércio local. Durante todo o processo judicial, ele negou envolvimento no crime.

A defesa sustenta que, além da ausência de provas materiais como DNA ou impressões digitais, os depoimentos usados contra Mairlon foram colhidos em um ambiente de coação, e nunca confrontados de forma adequada pelo Judiciário.

Conhecido como Crime da 113 Sul, o triplo homicídio ocorreu em 28 de agosto de 2009. Os corpos das três vítimas foram encontrados em decomposição três dias depois, no apartamento da família Villela, na Asa Sul, área nobre de Brasília. Eles receberam 73 facadas. O caso, que chamou a atenção dos investigadores pelo fato de a porta do apartamento não ter sido arrombada, segue vivo na memória dos moradores da capital federal e ganhou uma série documental, disponível no Globoplay.



Com informações da fonte
https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2025/10/15/crime-da-113-sul-um-grande-absurdo-diz-advogada-do-homem-que-passou-15-anos-preso-e-teve-a-condenacao-anulada.ghtml

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