Os 15.105 votos nas eleições de 2022, a estreia eleitoral de Tiego Raimundo dos Santos Silva, o TH Jóias, rendeu ao candidato apenas a segunda suplência pelo MDB na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Mas a morte de um dos eleitos, Otoni de Paula Pai, e a ida do substituto para o governo levaram o joalheiro dos famosos ao Legislativo em 12 de junho do ano passado. Ao tomar posse, ele jurou servir com “honra, lealdade e dedicação ao povo do Estado do Rio”. Não foi bem isso que mostrou uma investigação da Polícia Federal: ele foi preso na última quarta-feira sob a acusação de ser uma liderança do Comando Vermelho e, com sua influência, beneficiar os bandidos que aterrorizam a população. Seu grupo tinha sede de mais poder e, por isso, planejava lançar a candidatura de Gabriel Dias de Oliveira, o Índio do Lixão, preso por ligação com o tráfico, a vereador em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
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Gabriel Dias ganhou seu apelido, segundo a polícia, por chefiar o comércio de drogas na Favela do Lixão, em Duque de Caxias. Ele chegou a ser preso em 2015. Fora da cadeia, de acordo com o Ministério Público Federal, se abrigou no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio, e se tornou homem de confiança de Luciano Martiniano da Silva, o Pezão, chefe do Comando Vermelho na região.
Em mensagens interceptadas pela Polícia Federal durante a investigação, fica clara a intenção da quadrilha de aumentar seu braço político. Numa conversa, Luiz Eduardo Cunha Gonçalves, o Dudu, ex-assessor de TH na Alerj, diz a Índio que conversou com o joalheiro e com ex-subsecretário estadual de Defesa do Consumidor Alessandro Pitombeira Carracena, outro integrante do chamado Núcleo Político da facção, sobre a possibilidade de o traficante se candidatar a vereador em Caxias, seu reduto.
Na operação de quarta-feira, entre os 15 presos também estavam Dudu e Carracena. De acordo com a investigação, Índio era o responsável no Comando Vermelho pela compra e a venda de drogas, armas, equipamentos para a derrubada de drones e pela contabilidade da facção. Além de ter sido preso, TH perdeu a cadeira na Alerj, já que o primeiro suplente reassumiu o cargo, e foi expulso do MDB.
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Como revelou o GLOBO ontem, a investigação coloca TH Jóias como um dos chefes do CV. Também seria o cambista dos traficantes, tendo feito duas operações em que trocou R$ 9 milhões por dólares. Entre 2021 e 2023, ele e seus “associados” — termo usado pela PF — teriam movimentado R$ 13 milhões, apesar de ter informado à Justiça Eleitoral que não tinha bens.
Nas negociações de câmbio, o joalheiro diz ter um fornecedor de Petrópolis, na Região Serrana, que faria a cotação a R$ 5,37 com notas de cem dólares da “faixa azul” ou a R$ 5,20 com notas de “cabeça grande”. TH só queria receber o primeiro tipo de cédula, porque tem uma maior aceitação no mercado por ser mais nova e com mais elementos antifalsificação.
No entanto, uma dessas operações, em maio do ano passado, causou um desentendimento na facção. A investigação diz que TH e Dudu não devolveram parte do dinheiro a Pezão e gastaram o valor em um chá revelação. No mês seguinte, o joalheiro, enfim, tomaria posse na Alerj. Para o MPF, antes mesmo de assumir, ele prometeu um cargo para “agradar ao traficante” e amenizar o desgaste com a dívida.
Em uma conversa, três dias antes da posse, o então assessor Dudu diz a Índio que já estava “vendo as vagas” de TH na Alerj e que separou “uma das melhores” para sua esposa. Ele diz que fez o gesto “em gratidão a tudo”. E ainda destaca os benefícios que a vaga traria à nova funcionária.
“Tem auxílio alimentação alto e mais R$ 1,4 mil por cada filho. Vou fazer o cálculo amanhã, mas é em torno de R$ 12 mil líquidos e R$ 15 mil na carteira. Ela vai ser assessora parlamentar diretamente, como crédito alto em banco, cartão etc”, escreveu Dudu numa mensagem para Índio. Mas o cargo dado foi menos vantajoso: a mulher ficou nomeada até maio deste ano, recebendo R$ 2 mil mensais.
‘Crime e imoralidade’
“Tal fato configura não apenas uma imoralidade, mas um ato de lavagem de capitais e corrupção, onde o cargo público é utilizado como instrumento de remuneração indireta e mecanismo de blindagem institucional ao núcleo familiar de uma das lideranças da organização criminosa”, completa o relatório da PF.
Mais um cargo na Alerj foi negociado pelo grupo, mas a nomeação não se concretizou. O delegado federal Gustavo Stell, que, segundo a PF, fornecia informações sigilosas à facção, pediu uma vaga no parlamento, sem ser atendido.
Outro desentendimento na quadrilha envolveu a compra de bazucas antidrones por TH e Dudu. Porém, o tráfico demorou a quitar as mercadorias. Após várias cobranças, Índio enviou uma foto de pacotes de notas de R$ 2, no total de R$ 55 mil, que seriam o pagamento. Além disso, o CV reclamou que os equipamentos não estavam dando conta de tantos drones sobre a favela. Em resposta, Dudu diz que comprou novas antenas para potencializar as bazucas.
Procurado, o advogado de Sttell afirma que seu cliente é inocente. Os dos demais citados não retornaram ou não foram encontrados. A defesa de TH tem negado publicamente as acusações.
2025-09-07 00:01:00