Teatro, por Claudia Chaves: “Terminal”

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“Terminal”, engenhoso texto de Gustavo Vaz, dirigido por César Augusto, é um mergulho denso e preciso nas zonas borradas entre realidade e metaverso. Desde a primeira cena, percebe-se a mão precisa do diretor — também no espaço criativo — ao orquestrar um jogo dramático que se constrói como uma “cama de gato”: cada fio narrativo puxa outro, cada nó se desfaz apenas para revelar novas tramas.

Gustavo Vaz e Kelzy Ecard (Nil Caniné/Divulgação)

A encenação propõe um tabuleiro instável, onde o público é instado a decifrar, em tempo real, os limites do que é real e do que é simulação, até perceber que ambas as dimensões são faces da mesma moeda. Trata-se de um jogo entre Édipo e Jocasta; entre dois artistas que se constroem e dois amantes que se afastam; entre separação e conjunção, afastamento e presença, oráculo e revelação.

Os diálogos, aparentemente cotidianos, na voz e no corpo de Kelzy Ecard e Gustavo Vaz, provocam surpresa, riso, tristeza e indignação. A precisão de César Augusto se revela na fluidez com que ambos transitam por três personagens distintos, mudando de locais, posições e identidades sem jamais perder a coerência cênica. Nesse terreno, o trabalho de Kelzy é superior e impressionante, correspondido plenamente por Gustavo. Sua transição de mãe indiferente para figura vingativa, e desta para uma Jocasta desesperada, constrói uma linha dramática rara, em que vulnerabilidade e ferocidade convivem com naturalidade.

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(Nil Caniné/Divulgação)
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A direção de movimentos de Toni Rodrigues reforça essa clareza: não há gestos excessivos ou deslocamentos supérfluos; tudo é calculado, mas sem rigidez. A iluminação de Adriana Ortiz não apenas acompanha, mas dialoga com o texto — suaviza, amplia tensões, cria sombras e luzes que modelam o espaço e a percepção do espectador.

O texto de Gustavo carrega poesia e densidade, com a eterna inquietação sobre se há verdade ou não. O ritmo é de uma gangorra de emoções: riso, tristeza, perplexidade, indignação, inquietação. A estrutura não teme a fragmentação e tampouco oferece respostas prontas. O metaverso não é mero simulacro, mas reflexo distorcido e inquietante da realidade.

Gustavo Vaz e Kelzy Ecard em Terminal, foto Nil Caniné 9R4A2732
Gustavo Vaz e Kelzy Ecard (Nil Caniné/Divulgação)
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Em “Terminal”, passado e futuro dialogam, sonho e memória se sobrepõem, e a cena se transforma em um espaço-tempo maleável. O público sai mexido com o resultado, cuja proposta não é resolver, mas tensionar e questionar. Num momento em que a vida já transita entre mundos físicos e digitais, a montagem reafirma o teatro como lugar privilegiado para experimentar e sentir — lembrando que realidade e metaverso são inseparáveis.

Serviço:

Teatro Firjan SESI Centro 
Quintas e sextas, às 19 h; sábados e domingos, às 18h 

Claudia Chaves
(Arquivo/Arquivo pessoal)



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