O piloto do avião que caiu no Pantanal na última terça-feira — num acidente que matou o arquiteto chinês Kongjian Yu e os cineastas Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz e Rubens Crispim Jr. — tentou pousar sem visibilidade à noite, precisou arremeter e depois bateu numa árvore. A aeronace pegou fogo ao cair. As conclusões da delegada Ana Claudia Medina, responsável por investigar a tragédia aérea, foram reveladas pelo Fantástico, da TV Globo, na noite deste domingo (28).
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O piloto Marcelo Pereira de Barros, conhecido como Marcelo Pantaneiro, levava Kongjian Yu, um dos maiores arquitetos do mundo e os dois cineastas num voo pela na zona rural de Aquidauana, em Mato Grosso do Sul. O grupo, que estava na região para gravar um documentário, havia sido levado para três fazendas da região. O acidente ocorreu quando retornavam à pousada onde estavam hospedados, na noite de terça-feira.
Já havia escurecido. Segundo a delegada, o piloto não poderia mais voar naquele horário. Aquela pista só poderia operar até às 17 horas e 39 minutos, mas, segundo os investigadores, o piloto tentou aterrissar, às 18h03, pela primeira vez, desalinhado à pista. Por falta de visibilidade, ele arremeteu. O avião então fez o contorno, e ele tentou pousar novamente. A 300 metros da pista, se chocou com uma árvore de cerca de 20 metros de altura e caiu. Como estava abastecido com combustível, o avião se incendiou na queda, o que matou os quatro ocupantes.
Ana Claudia Medina afirmou à TV Globo que a polícia verificou galhos caídos e observou a copa da árvore danificada, o que deu pistas sobre a dinâmica do acidente.
A aeronave, de PT-BAN, era um modelo Cessna 175, fabricada em 1958, particular de Marcelo de Barros. De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), o avião não estava autorizado a voar durante a noite por não possuir os equipamentos noturnos necessários.
Em 2019, o avião de pequeno porte chegou a ser apreendido durante uma operação da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul (PCMS) contra táxi aéreo clandestino — serviço remunerado de transporte de passageiros ou cargas.
Em 2022, Marcelo Pereira foi autorizado a voar novamente com o mesmo avião, mas não tinha permissão para atuar como o táxi aéreo, nem para realizar voos noturnos. Em nota enviada ao Fantástico, o advogado e amigo do piloto, Djalma Silveira, afirmou que Marcelo era um profissional exemplar, amava a aviação e havia sanado as irregularidades.
O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos continua investigando o caso.
Kongjian Yu era considerado um dos principais nomes de sua área de atuação. A mais famosa de suas ideias ganhou o nome de “cidades-esponja”. A proposta do chinês é criar nos centros urbanos espaços de amortecimento, absorção e reaproveitamento das águas da chuva, para minimizar danos causados pelas enchentes. O conceito foi incluído em 2013 no plano nacional da China e hoje há centenas de projetos inspirados nele no país.
O arquiteto veio ao Brasil para participar da Conferência Internacional Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, realizado entre os dias 4 e 6 deste mês em Brasília.
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O chinês era professor da Universidade de Pequim, consultor do governo chinês e diretor do escritório de arquitetura paisagística Turenscape, considerado um dos maiores do mundo. Ao longo da carreira, graduou-se na Universidade Florestal de Pequim e obteve título de doutor em Harvard, nos Estados Unidos. Também possui doutorados honorários de universidades na Itália e na Noruega.
Ele publicou mais de 20 livros e 300 artigos científicos e recebeu prêmios como o IFLA Sir Geoffrey Jellicoe Award (2020), o Cooper Hewitt National Design Award (2023) e o RAIC International Prize (2025). Yu ainda atuava como editor-chefe da Landscape Architecture Frontiers.
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Gravação de documentário
Luiz Ferraz e Rubens Crispim Jr. filmavam Yu para um documentário sobre o trabalho do arquiteto, que é criador do conceito de cidades-esponja e um nome importante no campo do desenvolvimento sustentável.
O conceito diz respeito à implementação de espaços de amortecimento, absorção e reaproveitamento das águas da chuva para minimizar danos causados pelas enchentes. Em maio do ano passado, após as inundações que atingiram o Rio Grande do Sul, o arquiteto deu uma entrevista ao GLOBO e ressaltou a importância de conter o desmatamento.
O acidente com o arquiteto e os documentaristas foi o segundo no Pantanal este mês. No último dia 16, o médico ortopedista e pecuarista Ramiro Pereira de Matos morreu na queda da aeronave que pilotava, na região de Corumbá.
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Cineasta indicado ao Emmy
Ao longo da carreira, Luiz Ferraz se notabilizou pelo trabalho em documentários. Uma das obras que ele dirigiu, “Dossiê Chapecó: O Jogo por Trás da Tragédia (4×48′)” foi indicada ao Emmy Internacional, o maior e mais prestigioso prêmio atribuído a programas e profissionais de televisão. A obra, para WBD/HBO, em parceria com a Pacha Films, tratou do acidente aéreo que matou jogadores e treinadores da Chapecoense, além de jornalistas, em novembro de 2016. O profissional a dirigiu com os colegas Luis del Valle e Thom Walker.
Pela Olé Produções, Ferraz também trabalhou na obra “To Win or To Win”, do grupo árabe MBC/Shahid, sobre o Al Nassr FC, time atual do astro português Cristiano Ronaldo. O cineasta ainda atuou nas obras Paisagem Concreta, sobre o arquiteto Álvaro Siza, e Algo no Espaço, sobre artistas e escultores contemporâneos brasileiros.
Segundo a Academia Brasileira de Cinema, Ferraz também foi diretor do documentário “Miller & Fried – As Origens do País do Futebol”, em coprodução com a Globo Filmes, e da série “Tesouros do Tapajós”, gravada na floresta Amazônica.
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Além da carreira renomada, Ferraz foi um dos fundadores da roda de samba que deu origem ao grupo A Confraria do Pasmado, tradicional Cordão Carnavalesco da cidade de São Paulo.
“Cineasta documentarista talentoso e um dos fundadores do bloco, Luizão (como era chamado o cineasta) não apenas participou da criação do Pasmado: ele encarnava, como poucos, a alma da Confraria, que há mais de 20 anos leva música, alegria e resistência às ruas de São Paulo”, publicou a Confraria, na tarde desta quarta-feira, nas redes sociais.
De acordo com a nota, o cineasta “sempre esteve presente como símbolo do espírito coletivo” que move o grupo. A Confraria também definiu Ferraz como um “documentarista talentoso”, de “energia sempre intensa, generosa e contagiante”.
“Seu trabalho e sua paixão ajudaram a moldar não só o nosso bloco, mas também o carnaval de rua paulistano, que hoje pulsa forte e diverso graças, em parte, à sua dedicação”, diz outro trecho. “Fica a certeza de que Luizão seguirá conosco, no batuque, nas canções, na memória e no coração de cada integrante da Confraria”.
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