Obra que faz releitura da bandeira nacional é retirada de exposição em Petrópolis e gera polêmica: ‘inaceitável’, reagiu o artista

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Convidado oficialmente pelo Centro Cultural Quitandinha, em Petrópolis, para integrar a programação de artes visuais do Festival Sesc de Inverno, que está acontecendo em Itaipava, em Petrópolis, na Região serrana, o artista plástico Matheus Ribs foi surpreendido neste fim de semana com a retirada de seu trabalho da mostra. A obra faz uma releitura da bandeira do Brasil, com a inscrição “Kilomboaldeya”, substituindo o lema “Ordem e Progresso” , em referência a territórios indígenas e afro-brasileiros, segundo o seu criador.

O painel estava montado no Parque de Exposições de Itaipava. Sua retirada da exposição gerou polêmica nas redes sociais, onde havia tanto manifestações de apoio ao artistas como de repúdio pelo que chamaram de “violação” de um símbolo nacional. O artista interpretou o ato como uma “censura”.

Numa nota de repúdio publicada na sua rede social, ele conta que agentes da Guarda Municipal compareceram ao local “com um suposto alvará e chegaram a tentar prender o gerente do – alegando que a obra ‘descaracterizava o patrimônio nacional'”. O artista contou que a obra foi retirada também dos materiais de divulgação do evento, sem o seu consentimento. Ribs se queixou também que mesmo estando hospedado perto do local da mostra não foi procurado para qualquer diálogo.

“A decisão de retirá-la não foi fruto de debate artístico, técnico ou institucional: foi um ato de violência policial e de censura direta à liberdade de expressão, que evidencia o uso autoritário da força estatal contra a liberdade artística. Esse tipo de coerção é inaceitável e incompatível com um estado democrático de direito, além de representar uma violência simbólica e política”, escreveu acrescentando que “o direito À criação e à crítica simbólica é garantida pela Constituição brasileira”.

A O GLOBO, o artista disse que se sentiu violado no livre exercício da sua profissão. Afirmou ainda que a alegação genérica de “descaracterização do patrimônio nacional”, baseada numa legislação herdada do regime militar e anterior à Constituição de 1988, não se sustenta como justificativa legal legítima “para a censura ou remoção da obra”.

—Fica evidente que o verdadeiro incômodo reside no teor crítico da criação — uma defesa contundente das comunidades tradicionais indígenas e afro-brasileiras — exposta em uma cidade historicamente marcada por uma ideologia colonial e escravocrata. O episódio configura uma grave violação das liberdades individuais, revelando como o Estado se mobiliza para proteger símbolos de poder, mas não os corpos e territórios sistematicamente violados ao longo da história — disse o artista.

Ribs se queixou ainda de que o Sesc não prestou assistência jurídica nem forneceu acesso ao suposto alvará que teria motivado a remoção da obra, impedindo-o de tomar medidas cabíveis. Ele disse que ainda nesta terça-feira pretende se reunir com advogados e já foi informado que a Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados enviará ofícios ao Ministério Público e aos demais órgãos competentes.

Uma mensagem de apoio partiu da escritora e acadêmica Lilia Schwarcz, que numa rede social escreveu “censura nunca foi solução para nada: ao contrário”. E completou: “a bandeira já foi reinterpretada com as cores do Pan-africanismo, da comunidade LBBTQIA+, entre tantas outras — como a linda obra de Abdias Nascimento — e não vejo aqui sinal de desrespeito. Ao contrário, penso que se a cultura é pública, seu significado está sempre em questão.”

O deputado estadual Prof. Josemar (PSOL) também se manifestou contra a remoção da obra e informou que oficiará o Sesc e a Prefeitura de Petrópolis para “reverter a censura” à obra do artista. O parlamentar disse também que colocará Comissão de Combate às Discriminações da Alerj, da qual é o presidente, à disposição para apoiar o artista.

— A repressão da Guarda Civil Municipal de Petrópolis ao jovem artista Matheus Ribs não tem fundamento jurídico e legal. Sua obra de arte exibia nas letras da bandeira nacional, as palavras “KilomboAldeya”. Utilizaram uma lei da ditadura, de 1971, que foi extinta na Constituição de 1988, para proibirem a manifestação artística — afirmou o parlamentar.

O Sesc-RJ lamentou a retirada da obra e informou que a ação foi determinada pelas autoridades locais, com base na Lei nº 5.700/1971, que dispõe sobre a forma e o uso dos símbolos nacionais. A instituição afirmou , por nota que “entende que a Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade de expressão e considera que a diversidade de manifestações artísticas é fundamental para estimular o diálogo e a reflexão sobre temas relevantes para a sociedade.”

Procurada, a prefeitura de Petrópolis não respondeu.

O Sesc RJ lamenta a retirada da obra “KilomboAldeya”, do artista visual Matheus Ribs, que fazia parte da programação do Festival Sesc de Inverno no Parque de Exposições de Itaipava. A ação foi determinada pelas autoridades competentes, com base na Lei nº 5.700/1971, que dispõe sobre a forma e o uso dos símbolos nacionais.

O Sesc RJ, por sua vez, entende que a Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade de expressão e considera que a diversidade de manifestações artísticas é fundamental para estimular o diálogo e a reflexão sobre temas relevantes para a sociedade.

Reafirmamos nosso compromisso com a promoção da cultura e da democracia e expressamos nossa solidariedade ao artista.



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