o ano em que o roubo ao Louvre chamou mais atenção nas artes do que qualquer exposição

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Retrospectiva 2025: artes visuais — Foto: Arte de Luisa Penna


Em um ano de grandes mostras, a exemplo da 36ª Bienal de São Paulo e da 14ª Bienal do Mercosul, e lances recordes em leilões, o Museu do Louvre foi mais notícia nas páginas policiais do que nas de cultura. Na manhã do domingo de 19 de outubro, oito joias da realeza francesa, avaliadas em mais de US$ 100 milhões, foram levadas em uma ação espetacular que durou sete minutos.

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O roubo, executado com a ajuda de um guindaste e uma serra elétrica para abrir a janela da Galeria de Apolo, expôs a fragilidade da segurança do museu mais famoso do mundo. Até o momento, foram presos oito suspeitos, entre eles um homem de 34 anos detido no no aeroporto Charles de Gaulle tentando embarcar para a Argélia. Após críticas de autoridades pela falta de investimento em segurança, o museu anunciou o aumento de 45% dos ingressos para não europeus, como forma para melhorar sua situação financeira: a partir de 2026, estes visitantes pagarão 32 euros (R$ 198), 10 euros a mais que o valor atual.

Visão geral do Pavilhão da Bienal — Foto: Maria Isabel Oliveira

No Brasil, o grande evento de 2025 foi a 36ª Bienal de São Paulo, inaugurada em setembro e que segue em cartaz até 11 de janeiro, com o Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque do Ibirapuera, ocupado por 125 artistas e coletivos brasileiros e internacionais, sobretudo do Sul Global. Tendo o camaronês radicado na Alemanha Bonaventure Ndikung à frente da curadoria, junto aos cocuradores Alya Sebti, Thiago de Paula Souza, Anna Roberta Goetz e Keyna Eleison, o título da mostra, “Nem todo viandante anda estradas — Da humanidade como prática”, foi inspirado em um verso do poema “Da calma e do silêncio”, de Conceição Evaristo.

Os têxteis e obras em tramas se destacaram na seleção, como a ganense Theresah Ankomah, a nigeriana Ruth Ige, a cubana Maria Magdalena Campos, a amazonense Manauara Clandestina e o soteropolitano Alberto Pitta. O evento também ficou marcado pelo cancelamento de um debate com a princesa belga Marie-Esméralda Léopoldine em novembro, por ocasião da COP30. Ambientalista, Marie-Esmeralda é sobrinha-bisneta do Rei Leopoldo II (1835-1909), responsável por mais de dez milhões de mortes e mutilações no antigo Congo Belga. A Bienal justificou o cancelamento “dado o conflito entre o trágico passado colonial belga e os temas abordados pela exposição”.

Obras de André Vargas na mostra 'Nossa vida bantu' — Foto: Guito Moreto
Obras de André Vargas na mostra ‘Nossa vida bantu’ — Foto: Guito Moreto

Presente na maioria das obras da Bienal, a diáspora africana foi o foco de exposições que se destacaram como “Nossa vida bantu”, no Museu de Arte do Rio; “Ancestral: Afro-Américas”, nos CCBBs de Belo Horizonte, Rio e Salvador; “O poder de minhas mãos”, no Sesc Pompeia; “A terra, o fogo, a água e os ventos – Por um Museu da Errância com Édouard Glissant”, no Instituto Tomie Ohtake; e “Gordon Parks – A América sou eu”, no IMS Paulista.

Em Porto Alegre, a 14ª edição da Bienal do Mercosul foi inaugurada em março após um adiamento de 11 meses causado pela enchente no Rio Grande do Sul em maio de 2024, que matou mais de 180 pessoas. A mostra com 77 artistas ocupou 18 locais, inclusive alguns pela cheia, como o Farol Santander e a Usina do Gasômetro, ambos no Centro Histórico.

Autorretrato de Frida Kahlo é vendido por R$ 292,6 milhões e quebra recorde mundial para artista mulher — Foto: Reprodução
Autorretrato de Frida Kahlo é vendido por R$ 292,6 milhões e quebra recorde mundial para artista mulher — Foto: Reprodução

Em um ano em que o mercado de arte teve queda de 33,5% no volume de negócios em relação a 2024, o mais baixo desde 2009, a salvação veio de artistas consagrados (e investimentos garantidos) na temporada de leilões de Nova York no mês passado. Ambos vendidos pela Sotheby’s, “Retrato de Elisabeth Lederer”, do austríaco Gustav Klimt, foi arrematado por US$ 236,4 milhões, tornando-se a segunda obra de arte mais cara já vendida em leilão (atrás de “Salvator Mundi”, atribuído a Leonardo da Vinci), e o mais caro trabalho moderno moderna já leiloado, enquanto “El sueño”, de Frida Kahlo, foi vendido por US$ 54,7 milhões, estabelecendo um recorde para uma obra feita por uma artista mulher.

A SP-Arte reuniu 102 expositores em sua 21ª edição, em abril, enquanto a 15ª ArtRio, em setembro, mudou a direção, com a saída de sua fundadora, Brenda Valansi. A operação passou totalmente para a Dream Factory, integrante da sociedade desde 2019, tendo à frente a diretora artística Maria Luz Bridger.

O ano delas na Casa Roberto Marinho

Beatriz Milhazes na Casa Roberto Marinho — Foto: Leo Martins
Beatriz Milhazes na Casa Roberto Marinho — Foto: Leo Martins

Beth Jobim: em abril, a pintora inaugurou no centro cultural do Cosme Velho a Individual “A inconstância da forma”, com mais de 70 obras de seus 40 anos de carreira, e a mostra “Entre olhares”, na qual estabeleceu um diálogo com a coleção local. Com curadoria de Paulo Venancio Filho, o solo de Beth reuniu pinturas em telas e papel, além de obras em outras técnicas e suportes, como desenhos, esculturas e têxteis.

Beatriz Milhazes: em setembro, foi a vez de outra expoente da célebre coletiva “Como vai você, Geração 80?”, de 1984, na EAV do Parque Lage, ocupar os dois andares da CRM. Em primeira individual institucional no Rio em 12 anos, com curadoria de Lauro Cavalcanti, Beatriz mostrou em “Pinturas nômades” sua produção em grande escala criada para espaços como a Tate Modern, em Londres; a Pinacoteca de São Paulo, a Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa; a Ilha de Inujima, em Okinawa, no Japão, e seu projeto para a 60ª Bienal de Arte de Veneza, em 2024.

Sebastião Salgado em 2020 — Foto: INA FASSBENDER / AFP
Sebastião Salgado em 2020 — Foto: INA FASSBENDER / AFP

Sebastião Salgado: Um dos maiores fotógrafos do mundo, o mineiro morreu em maio, aos 81 anos, de leucemia. Poucos dias após seu falecimento, a Casa Firjan, em Botafogo, na Zona Sul do Rio, inaugurou a exposição “Trabalhadores”, com uma de suas séries mais célebres, que se tornou sua primeira mostra póstuma.

Koyo Kouoh: No mesmo mês, o mundo da arte foi pego de surpresa com a morte da camaronesa radicada na Suíça, aos 57 anos, escolhida como a curadora da Bienal de Veneza de 2026, sucedendo o brasileiro Adriano Pedrosa. A Bienal confirmou, dias depois, que sua curadoria será mantida.

Katie van Scherpenberg: Pintora, desenhista e gravadora, a paulistana, que lecionou no MAM do Rio e na EAV, morreu em junho aos 84 anos.

Trono de ouro: arte ou curiosidade?

Instalação de "America", de Maurizio Cattelan, no Museu Solomon R. Guggenheim, em Nova York, em 2016 — Foto: Kristopher McKay/Guggenheim
Instalação de “America”, de Maurizio Cattelan, no Museu Solomon R. Guggenheim, em Nova York, em 2016 — Foto: Kristopher McKay/Guggenheim

Após ter “Comediante”, obra composta por uma banana colada com fita adesiva, arrematada por US$ 6,2 milhões em 2024, o italiano Maurizio Cattelan foi destaque na temporada de leilões novamente, com um vaso sanitário de ouro 18 quilates vendido por US$ 12,1 milhões (cerca de R$ 75 milhões) em novembro pela Sotheby’s. “America” é uma escultura em duas edições (a outra foi roubada do Palácio de Blenheim, na Inglaterra, em 2019) e foi arrematada pelo museu de curiosidades Ripley’s Believe It or Not!.

Principal mostra do programa “Histórias da ecologia”, desenvolvido pelo Masp em 2025, “A ecologia de Monet” bateu o recorde de público do museu paulistano, superando marca de 410 mil visitantes, oito mil a mais da marca anterior, com “Tarsila popular”, em 2019. A seleção de 32 obras de Claude Monet, parte delas nunca mostradas no Hemisfério Sul, bateu o próprio recorde do francês no local, superando os 401 mil visitantes da exposição “O mestre do impressionismo”, de 1997.

Protesto e frustração na arte de IA

O primeiro leilão só de obras criadas com a ajuda da inteligência artificial (IA), pela Christie’s, entre fevereiro e março, enfrentou protestos e teve resultados mornos. Uma carta aberta com mais de seis mil assinaturas pediu o seu cancelamento, alegando roubo de propriedade intelectual. No final, 14 dos 34 lotes não receberam lances suficientes ou foram vendidos por um valor abaixo da faixa de estimativa. Uma das exceção foi “Machine Hallucinations — ISS Dreams — A”, de Refik Anadol (foto), arrematado por US$ 277 mil.

Brasileiros no Hemisfério Norte

Brasileiros brilharam no exterior em retrospectivas e individuais. Adriana Varejão ocupou a Fundação Calouste Gulbenkian com uma mostra em diálogo com obras de Paula Rego, além de individuais em Nova York e Atenas; Beatriz Milhazes inaugurou em março uma individual no Guggenheim de Nova York; e Lucas Arruda foi o primeiro artista do Hemisfério Sul a expor no Museu d’Orsay, em Paris, com a individual “Que importa a paisagem”. No contexto do Ano Cultural Brasil-França, a capital francesa recebeu mostra de nomes como Anna Maria Maiolino e Ernesto Neto.



Com informações da fonte
https://oglobo.globo.com/cultura/artes-visuais/noticia/2025/12/03/retrospectiva-2025-o-ano-em-que-o-roubo-ao-louvre-chamou-mais-atencao-nas-artes-do-que-qualquer-exposicao.ghtml

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