Haddad diz que Derrite não entende de ‘inteligência contra o crime organizado’ e critica pressa em projeto Antifacção

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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad — Foto: Diogo Zacarias/MF


O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, criticou nesta quarta-feira o relator do projeto Antifacção, Guiilherme Derrite (PP-SP), que segundo ele, não é um entende propriamente de “inteligência e investigação” do crime organizado. Haddad disse não entender “pressa” em votar o texto sobre o assunto.

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— Nós demos uma demonstração de integração para asfixiar o crime organizado há dois, três meses. Você vai colocar isso a perder em função do açodamento de um relator que, com todo respeito, não é propriamente uma pessoa que entenda de inteligência e investigação, não é uma pessoa versada em investigação e inteligência — disse Haddad. — Ainda não sei o texto que vai ser votado, mas o que eu não entendo é que essa pressa de votar sem discutir com o governo. PF e Receita são órgãos de estado, e enfraquecer esses órgãos não faz o menor sentido.

Mais cedo, a ministra da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Gleisi Hoffmann, havia dito que ainda há quatro pontos do projeto Antifacção que precisam ser suprimidos pelo relator, o deputado Guilherme Derrite (PP-SP). Na visão do governo, tratam-se de pontos “inegociáveis” e que se não forem retirados, “desconfiguram” o projeto inicial, proposto pelo Ministério da Justiça. Por causa disso, o Palácio do Planalto trabalha para que a votação do texto de Derrite seja adiada.

Os itens problemáticos na visão do governo tratam de sobreposição de leis; do risco de perda de recursos pela Polícia Federal; da tipificação penal de “facção criminosa”; e do confisco de bens das organizações criminosas apenas ao fim do processo judicial. Esses pontos foram elencados em uma reunião entre Secretaria de Relações Institucionais, o Ministério da Justiça e a Casa Civil, que ocorreu na manhã desta quarta. O grupo discutiu o parecer apresentado na noite de terça pelo secretário licenciado de Segurança de São Paulo.

Mais cedo, Derrite afirmou estar preocupado em construir um texto que não seja contestado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e admitiu que pode fazer novas mudanças no texto. Ele já apresentou três versões diferentes de seus relatório.

Gleisi afirmou que o Ministério da Justiça segue fazendo uma avaliação mais detalhada dos pontos e que o grupo focou em debater o que é “estruturante” para o projeto:

— A gente focou naquilo que é estruturante e que pode realmente tornar a lei totalmente ineficaz, que são esses pontos — afirmou Gleisi — Claro que outros pontos são pontos que a gente vai buscar conversar, ajustar, mas esses eu diria que são pontos praticamente inegociáveis, porque desconfiguram o projeto — disse.

Diante desse cenário, a ministra defende que a votação do texto seja adiada para que as alterações possam ser feitas.

— Conversei com os nossos líderes de governo para que conversassem com o presidente do Motta, dissessem à direção da Casa, se vai votar hoje mesmo. Se não votar, eu quero marcar com ele para a gente conversar. Pela complexidade da matéria, seria importante ter mais tempo pra discutir. E arredondar todos os pontos — acrescentou Gleisi.

Quatro pontos do projeto que governo quer retirar do texto:

  1. Sobreposição de leis: Com o novo parecer de Derrite, seria criada uma nova lei que trata de organizações criminosas, mas sem alterar a anterior. Foi detectado pelo Ministério da Justiça um erro de técnica legislativa, com a geração de uma sobreposição. Advogados dos criminosos iriam, na visão dos técnicos do governo, se valer nesse caso da lei anterior, que prevê punições mais brandas. A falha é considerada fruto do açodamento para votar o texto.
  2. Risco de perda de recursos pela PF: O Ministério da Justiça aponta que o novo parecer prevê uma destinação genérica dos recursos oriundos de apreensão de bens de traficantes e membros de organizações criminosas para os fundos estaduais ou distritais de Segurança Pública. O entendimento é que os casos em que a investigação, apreensão e o julgamento se derem em esfera federal os valores deveriam ser revertidos para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol) e para o Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). Por isso, a pasta considera que esse ponto do novo parecer é inconstitucional e afronta a legislação federal. Para os técnicos do Ministério da Justiça, a omissão à previsão de destinação dos recursos para fundos federais pode levar a uma descapitalização desses fundos e, no fim das contas, deixar a Polícia Federal e os presídios federais com menos dinheiro.
  3. Tipificação penal de “facção criminosa”: O projeto original propõe a criação do tipo penal de “facção criminosa” para diferenciar de organização criminosa e facção. Na visão do governo, a facção criminosa é uma organização mais elaborada, com domínio territorial, econômico, atuação interestadual e transnacional. O objetivo é enquadrar penalmente facções e milícias, o que é considerado a espinha dorsal do projeto. Derrite suprimiu este ponto e instituiu o crime de “domínio social estruturado”, que prevê um total de 11 tipos de condutas criminosas. Entre elas estão: o uso de violência para ameaçar a população com o objetivo de exercer o controle sobre comunidades; a restrição, ainda que de modo temporário, da livre circulação de pessoas, bens e serviços, públicos ou privados, sem motivação legítima reconhecida pelo ordenamento jurídico; promover ataques, com violência ou grave ameaça, contra instituições prisionais. O governo considera a tipificação de “facção criminosa” mais adequada à realidade e mais fácil de ser comunicada para a população.
  4. Confisco de bens: O governo concluiu que o novo parecer de Derrite estabelece que os bens de membros de organizações criminosas só podem ser arrastados ao fim da ação judicial. Na proposta original, esse confisco poderia ocorrer na abertura da investigação com o objetivo de asfixiar financeiramente as quadrilhas. “Colocamos no projeto que essas facções perdem os seus bens a partir do momento que começa a investigação. No relatório isso só vai acontecer só depois do trânsito em julgado da sentença condenatória e você corre o risco de não capturar esses bens”, explica Gleisi.

Integrantes da equipe técnica do Ministério da Justiça que trabalham na análise detalhada sobre a terceira versão do texto de Derrite chegaram à conclusão que a melhor estratégia é adiar a votação do texto:

— Não tem a menor condição do projeto ser votado da forma que está. Você pode acabar colapsando o sistema penal e prisional, o que vai beneficiar o crime organizado — afirmou o secretário Nacional de Assuntos Legislativos da pasta, Marivaldo Pereira.

A equipe da pasta defende a retomada do texto original, que aumentava a pena para líderes de facções e a aliviava para quem tinha bons antecedentes e não exercia função de chefia. Com o texto atual, a pena de 20 a 40 anos de prisão vale para qualquer integrante do grupo, sem atenuantes.

Além das penas mais altas, o projeto prevê que suspeitos presos por esses novos tipos penais não terão direito a “anistia, graça, indulto, fiança e livramento condicional” – o que tende a aumentar a população carcerária.



Com informações da fonte
https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2025/11/12/haddad-diz-que-derrite-nao-entende-de-inteligencia-contra-o-crime-organizado-e-critica-pressa-em-votacao-de-projeto-antifaccao.ghtml

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