Aos 88 anos, Conceição Evaristo tem uma das agendas mais concorridas da 23ª edição da Flip — Festa Literária Internacional de Paraty.
A escritora se apresenta nas casas parceiras do evento.
No sábado (2), na Casa República, às 16h, ela integra a mesa Anotações de um Brasil que Arde, com mediação de Lilia Guerra.
Já no domingo (3), às 11h, na Casa Estante Virtual, ela participa do bate-papo 10 Anos da Editora Malê: Mercado Editorial e Autoria Negra, com a escritora Eliana Alves Cruz e mediação da jornalista Adriana Ferreira Silva.
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Confira abaixo a conversa com a escritora com VEJA RIO diretamente de Paraty.
Há uns anos, houve um manifesto de intelectuais negras falando que da falta de diversidade na Flip. Como a senhora vê essa questão hoje?
Olha, teve uma mudança muito, muito significativa, em 2017, através da (professora universitária) Giovana Xavier, que escreveu um texto chamando a Flip de arraial da branquidade. No ano seguinte, com a gestão da Joselia Aguiar, ela conseguiu mudar a cara do evento. Eu acho que Paraty nunca ficou tão diversa como em 2018. Deixou uma marca. Tem tido uma diversidade, sim, inclusive com autores africanos negros e afro-americanos. Na pandemia, eu fiz uma debate on-line com a Alice Walker. Hoje de manhã eu fiz uma mesa com a Auritha Tabajara, que é uma menina indígena, então a Flip está buscando, sim, essa diversidade. Quanto mais o evento se aprofundar na diversidade brasileira, mais significado terá. É uma questão de justiça, de reconhecimento e de uma representatividade maior da própria literatura brasileira.
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A senhora falou há uns anos: “Eu estou sendo reconhecida, mas meu reconhecimento está vindo tarde, eu já tenho 70 anos”. Sendo uma escritora negra presente em eventos que são dominados pela branquitude, a senhora vive muitas violências? É um espaço difícil de ocupar, por esse lado?
Olha, hoje, no espaço literário, as pessoas são gentis comigo. Eu não estou falando de educação, eu estou falando de respeito. Mas isso não aconteceu de uma hora para outra. Quando eu ganhei o Jabuti, uma editora perguntou para mim o que significava aquele prêmio, e eu falei: “É o prêmio da solidão”. Porque eu não vi pessoas negras naquele espaço, eu contava nos dedos de uma só mão as pessoas negras naquele lugar. Mas foi preciso o prêmio Jabuti para que escritores e escritoras brancas me reconhecessem. Não são todos, tá? Mas, por exemplo, eu já tinha ido a seminários, participado do mesmo evento, ficado no mesmo hotel e alguns escritores passavam por mim como se eu não existisse. Quando eu ganhei o prêmio Jabuti, foi como se esse prêmio desse uma crença: “Então essa mulher ela escreve mesmo”. Hoje transito aqui na Flip, transito no meio das pessoas brancas, e as pessoas têm uma uma respeitabilidade muito grande para comigo, um carinho, um cuidado, mas comigo é fácil. Eu quero ver ter esse mesmo respeito com a pessoa negra que está passando ali na rua. Então, a maneira como as pessoas me tratam não me ilude, não. Porque a questão do racismo no Brasil está aí para todos nós, para ser resolvida. E também, quando eu saio do espaço em que as pessoas me conhecem, eu entro no supermercado, eu sou seguida. Se eu entro num grande shopping, as pessoas me olham com desconfiança. O fato de eu ser escritora não me blinda. Protege em ambientes em que eu sou conhecida. Tem essa nuvem, essa coisa que fica assim meio que embotada nas relações raciais brasileiras: dependendo do lugar, dependendo da pessoa que você é, dependendo do que você faz… Mas a afirmativa que eu faço é: eu sou uma pessoa negra, né? Negra retinta. Então, eu sou sujeita ainda a determinados violências nos espaços em que não me conhecem.
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O que a senhora achou de finalmente a ABL admitir uma mulher negra, depois de tanto tempo, depois da sua candidatura ter exposto essa falta de diversidade? A senhora tem desejo de se candidatar outra vez?
No momento, a única coisa que eu falo com você é que eu parabenizo a Ana Maria Gonçalves e desejo que ela tenha bons dias na academia. É a única coisa que eu falo, porque não sei se eu vou me candidatar. No momento, a minha preocupação é completar três ou quatro obras que eu estou escrevendo.
Tem previsão de lançamento para próxima?
Lanço dois livros ainda este ano.
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