Ao menos 251 postos de combustível em quatro estados foram vinculados aos investigados na Operação Carbono Oculto, a maior já deflagrada mirando o braço financeiro do Primeiro Comando da Capital (PCC), revelou levantamento do portal g1. A infiltração preocupante do crime organizado em atividades formais também está presente no mercado ilegal de bebidas adulteradas e de cigarros. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as organizações criminosas lucram mais com a venda ilegal de combustíveis, bebidas, cigarro e ouro (cerca de R$ 146 bilhões por ano) que com o tráfico de drogas (RS 15 bilhões).
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Em agosto, a Carbono Oculto revelou o uso de postos de combustíveis, fintechs e fundos sediados no coração financeiro paulistano, a Avenida Faria Lima, para lavar dinheiro das atividades criminosas do PCC. Segundo as investigações, o esquema permeava toda a cadeia de combustíveis, das usinas de cana-de-açúcar às bombas. Em grande parte, os valores que os postos recebiam em dinheiro ou cartão eram canalizados para o PCC, somando R$ 52 bilhões entre 2020 e 2024. A maioria dos postos identificados no levantamento do g1 fica no Estado de São Paulo, especialmente na Região Metropolitana da capital e na Baixada Santista. Quase metade não tem vínculo com distribuidoras, mas também há na lista marcas conhecidas, amplamente usadas pelos brasileiros.
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A produção clandestina de bebidas e a venda de produtos falsificados ou adulterados ganharam destaque nas últimas semanas com a sucessão de mortes e internações sob suspeita de intoxicação por metanol em produtos como gim, vodca e uísque — vários deles usando também marcas conhecidas. Embora a polícia não tenha encontrado evidências de relação com organizações criminosas, a hipótese não foi descartada.
A atuação dos grupos criminosos que aterrorizam a população e catapultam os índices de violência não é danosa apenas do ponto de vista da segurança pública. Produtos adulterados resultam também em crimes contra o consumidor e até em problemas graves de saúde. Nunca se sabe o que está dentro de uma garrafa de bebida produzida em fundo de quintal, à margem das normas sanitárias, ou qual o resultado de abastecer o carro nos postos controlados pelo crime.
O combate às quadrilhas precisa ser abrangente e sistemático. A extensão da infiltração do crime na economia formal exige uma estratégia consistente, que não se resuma a intervenções pontuais ou a megaoperações. Primeiro, é fundamental coibir empresas que ajudam a lavar o dinheiro das atividades ilegais e dão sustentação financeira às quadrilhas, como fez a Carbono Oculto. Embora tais investigações não acabem com o crime organizado, servem para asfixiá-lo e enfraquecê-lo. Segundo, é preciso garantir ao Estado os poderes de investigação e punição necessários no combate às máfias, previstos na PEC da Segurança felizmente em discussão no Congresso. Também é essencial elaborar e aprovar a Lei Antimáfia, fundamental no combate a grupos sofisticados como o PCC. Por fim, é crítico o envolvimento de Executivo, Legislativo e Judiciário para debelar a contaminação das instituições pelo crime e evitar a transformação do Brasil num narcoestado.