A data tem como propósito conscientizar e prevenir contra os níveis elevados de um dos principais fatores que contribuem para o desenvolvimento de diversas doenças cardiovasculares
O Dia Nacional de Prevenção e Controle do Colesterol, celebrado anualmente em 8 de agosto, representa um marco fundamental para a saúde pública no Brasil. A data tem como propósito primordial promover ações de conscientização e prevenção contra os níveis elevados de colesterol, um dos principais fatores que contribuem para o desenvolvimento de diversas doenças cardiovasculares. A relevância dessa iniciativa é sublinhada por dados alarmantes do Ministério da Saúde, que indicam que cerca de 40% da população brasileira, incluindo crianças, apresenta colesterol elevado. As doenças desencadeadas por esse fator são, lamentavelmente, a primeira causa de mortalidade no país, resultando em aproximadamente 300 mil óbitos anuais.
A função do colesterol no corpo
O colesterol, apesar de sua reputação frequentemente negativa, é um composto químico gorduroso e essencial para o funcionamento do organismo. Ele é um componente vital na estrutura de todas as células, participa da formação de ácidos biliares que auxiliam na digestão e compõe hormônios, além de algumas vitaminas, notadamente a vitamina D. A compreensão de que o colesterol é intrínseco à biologia humana, e não inerentemente prejudicial, é crucial. O desafio está no desequilíbrio de seus níveis no sangue, tornando a educação contínua sobre sua função e os riscos do excesso uma necessidade premente para a saúde coletiva.
A necessidade de intervir precocemente no controle do colesterol é uma observação crítica. A alta prevalência de colesterol elevado em crianças e adolescentes, conforme apontado pelas estatísticas, indica que os fatores de risco para doenças cardiovasculares estão se manifestando em idades cada vez mais jovens. Isso sugere que as estratégias de prevenção devem ser iniciadas ainda na infância, com o rastreamento recomendado a partir dos 2 anos de idade. A intervenção precoce pode mitigar o acúmulo de danos ao longo da vida, potencialmente alterando a trajetória de saúde de milhões de brasileiros e reduzindo a carga futura de doenças cardiovasculares.
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Tipos de colesterol e seus papéis
Existem dois tipos principais de colesterol, popularmente conhecidos como “bom” e “mau”:
- LDL Colesterol (Lipoproteína de Baixa Densidade): Conhecido como “mau colesterol”, o LDL é responsável por carregar o colesterol para as células. Em excesso, pode se depositar nas paredes das artérias, formando placas de gordura em um processo chamado aterosclerose. Essas placas estreitam as artérias, dificultando a circulação sanguínea e aumentando significativamente o risco de eventos cardiovasculares graves, como infarto e derrame. Por essa razão, manter os níveis de LDL baixos é uma meta essencial na prevenção de doenças cardiovasculares.
- HDL Colesterol (Lipoproteína de Alta Densidade): Denominado “bom colesterol”, o HDL atua removendo o colesterol das células e transportando-o de volta para o fígado, onde é eliminado do corpo através da bile. Essa ação ajuda a evitar o entupimento das artérias, contribuindo para a “limpeza” do sistema circulatório. Portanto, manter os níveis de HDL altos é desejável para a saúde cardiovascular.
A diferenciação entre LDL e HDL é fundamental para uma compreensão precisa do colesterol e de seus efeitos no organismo. Não se trata de uma substância uniformemente prejudicial, mas sim do equilíbrio entre suas formas de transporte. Uma abordagem simplista que demoniza todo o colesterol pode levar a equívocos e negligenciar a importância do HDL. A educação sobre esses dois tipos distintos e suas funções específicas permite que os indivíduos compreendam melhor os resultados de seus exames e as recomendações médicas, promovendo uma gestão mais informada da saúde cardiovascular.
Panorama brasileiro e desafios atuais
O cenário do colesterol elevado no Brasil é motivo de grande preocupação para a saúde pública. Dados da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) revelam que 4 em cada 10 adultos brasileiros, ou seja, cerca de 40% da população adulta, possuem diagnóstico de colesterol alto. A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019, que coletou dados autorreferidos, indicou que 14,6% dos adultos relataram o diagnóstico de colesterol elevado. Embora os dados autorreferidos possam subestimar a prevalência real, outras pesquisas baseadas em exames laboratoriais apontam prevalências ainda maiores, como 32,7% de colesterol total alto e 18,6% de LDL aumentado entre 2014 e 2015.
A situação é particularmente alarmante entre crianças e adolescentes. Uma revisão de estudos realizada por pesquisadores da Escola de Enfermagem da UFMG, utilizando parâmetros da SBC, constatou que mais de um quarto (27,4%) das crianças e adolescentes brasileiros, com idades entre 2 e 19 anos, apresentam colesterol alto. Destes, 19,2% já possuem alteração no LDL, o “colesterol ruim”. Essa evidência de que a dislipidemia está se manifestando precocemente na população jovem intensifica a urgência de ações preventivas direcionadas a essa faixa etária.
O impacto do colesterol elevado não se restringe à saúde individual; ele impõe uma carga econômica substancial ao sistema de saúde. Anualmente, mais de R$1 bilhão é gasto no Sistema Único de Saúde (SUS) com procedimentos cardiovasculares. A Sociedade Brasileira de Cardiologia estima que aproximadamente 50% dos infartos do miocárdio e acidentes vasculares cerebrais poderiam ser evitados se os níveis de colesterol estivessem dentro das recomendações dos especialistas. Essa projeção destaca o grande potencial de prevenção e o retorno significativo do investimento em políticas públicas focadas no controle do colesterol. A redução da prevalência de colesterol alto não apenas salvaria vidas e melhoraria a qualidade de vida, mas também aliviaria a pressão financeira sobre o sistema de saúde, liberando recursos para outras áreas críticas.
Fatores de risco, consequências e prevenção
Um dos aspectos mais perigosos do colesterol elevado é sua natureza assintomática na maioria dos casos. A condição é frequentemente descrita como um “problema de saúde silencioso”, pois não causa sintomas diretos que alertem o indivíduo sobre sua presença. Os sinais e sintomas, quando aparecem, geralmente são uma consequência da formação de placas de gordura nas artérias (aterosclerose), indicando que a situação já pode estar avançada. Em casos raros, o excesso de colesterol no sangue pode levar à formação de nódulos nos tendões (xantomas) ou manchas amarelas ao redor dos olhos (xantelasmas). No entanto, a detecção da condição depende quase que exclusivamente de exames de rotina, como o perfil lipídico.
Quando o colesterol alto não é controlado, ele se torna um fator de risco significativo para uma série de doenças cardiovasculares graves. As principais consequências incluem:
- Infarto Agudo do Miocárdio (IAM): O acúmulo de placas de gordura nas artérias coronarianas pode levar à sua obstrução, resultando em dor no peito (angina) e, em casos mais graves, infarto.
- Acidente Vascular Encefálico (AVC) ou Derrame: Placas de gordura nas artérias que irrigam o cérebro podem causar obstrução ou rompimento, levando ao AVC.
- Insuficiência Cardíaca: O descontrole do colesterol pode contribuir para a falência do coração.
- Doença Arterial Obstrutiva Periférica: Obstrução de artérias em outras partes do corpo.
- Hipertensão Arterial, Diabetes e Obesidade: O colesterol alto está frequentemente associado a essas condições, que por sua vez, são fatores de risco adicionais para doenças cardiovasculares.
A elevação do colesterol é influenciada por uma combinação de fatores genéticos e de estilo de vida. Embora a predisposição genética possa tornar alguns indivíduos mais suscetíveis, a dieta e os hábitos diários desempenham um papel crucial. Os principais fatores que contribuem para o colesterol elevado incluem:
- Alimentação inadequada: Consumo excessivo de gorduras saturadas (presentes em alimentos de origem animal como carnes gordas, laticínios integrais, manteiga, e também em óleos de dendê e coco) e gorduras trans (encontradas em produtos industrializados como biscoitos, pães, sorvetes e salgadinhos). O excesso de carne vermelha também contribui.
- Sedentarismo: A falta de atividade física regular contribui para o desequilíbrio dos níveis de colesterol.
- Tabagismo: O cigarro é conhecido por reduzir os níveis de HDL, o “bom colesterol”.
- Consumo excessivo de álcool e açúcar: Contribuem para o aumento da pressão arterial, colesterol, triglicerídeos e ganho de peso, elevando o risco cardiovascular.
- Obesidade: Um fator de risco importante para o colesterol alto e outras doenças cardiovasculares.
A compreensão de que o risco cardiovascular é multifatorial é essencial. O colesterol elevado raramente age isoladamente; ele se interliga com outras condições como hipertensão, diabetes e obesidade, amplificando o perigo para a saúde do coração e dos vasos sanguíneos. Essa interconexão significa que a gestão eficaz do colesterol não pode ser feita de maneira isolada, mas deve integrar uma abordagem mais ampla, contemplando todos os fatores de risco. A atenção a um estilo de vida saudável, incluindo dieta adequada, atividade física, controle de peso e eliminação de hábitos prejudiciais, é a estratégia mais eficaz para mitigar o risco cardiovascular de modo abrangente.
Campanhas e mobilização social
O Brasil tem desenvolvido um ecossistema robusto e colaborativo de campanhas e iniciativas para a conscientização e combate ao colesterol elevado, envolvendo diversas instituições de saúde e organizações da sociedade civil. Essas ações são essenciais para disseminar informações e incentivar a população a adotar hábitos mais saudáveis.
O Ministério da Saúde desempenha um papel central, promovendo ações de conscientização e prevenção em todo o país. Além da educação, a pasta investe na garantia do tratamento, assegurando a gratuidade de medicamentos para colesterol alto por meio do programa Farmácia Popular, um dos mais importantes programas de saúde pública no Brasil. Essa medida é vital para remover barreiras financeiras e garantir que o tratamento seja acessível a milhões de brasileiros.
A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) é uma das principais vozes nessas campanhas. No Dia Nacional de Prevenção e Controle do Colesterol, a SBC promove campanhas de comunicação que destacam a importância da alimentação balanceada, rotina de exercícios e adesão ao acompanhamento e tratamento da doença. A SBC também disponibiliza conteúdo digital personalizável para ampla divulgação, incentivando a participação ativa de profissionais de saúde e da população.
Para as políticas públicas, a continuidade e ampliação das campanhas de conscientização são indispensáveis. Tais ações devem focar na educação desde a infância, desmistificando o colesterol e enfatizando o equilíbrio entre LDL e HDL. Facilitar o acesso ao diagnóstico por meio de exames gratuitos e garantir o acesso a medicamentos, como no programa Farmácia Popular, são iniciativas que transformam a conscientização em ação concreta. Além disso, é fundamental uma maior integração entre Ministério da Saúde, sociedades médicas, organizações civis e hospitais para uma abordagem mais holística e eficaz no combate às doenças cardiovasculares.
Um futuro com menos colesterol elevado e, consequentemente, menos doenças cardiovasculares, é uma meta possível. Isso exige esforço contínuo e colaborativo de toda a sociedade, com prioridade para educação, prevenção e acesso a cuidados de saúde de qualidade. Ao investir na saúde cardiovascular hoje, o Brasil pode proteger a vida de seus cidadãos e construir uma nação mais saudável e resiliente.
E você, já conhece seus números de colesterol? Conhece alguém que tem colesterol elevado? Na dúvida, procure seu médico de confiança e mantenha seus exames em dia.
*Por Rodrigo Almeida Souza, MD, PHD, FESC, TEC – CRM-PA 7926 / RQE 4130 / 4137
Cardiologia Clínica e Intervencionista