Tenho uma amiga corredora que descobriu há pouco tempo, por acaso, que o filho tem diabetes tipo 1. Foi por um triz: no hospital para uma emergência, aplicaram soro glicosado antes de checar a glicemia e o rapaz quase entrou em coma. O susto virou bandeira. Competente que é, a servidora pública Renee Assayag se mexeu rápido: na base do boca a boca e do amor, juntou apoiadores, chamou gente de peso e organizou um encontro com corrida (claro!) e muito mais para chamar a atenção para o que ajuda a salvar vidas: esporte e informação.
Eu já garanti minha inscrição no Movimento Azul, que nasceu para marcar o mês azul de conscientização sobre diabetes.
É o evento certo, na hora certa. Em 2025, o tema explodiu nas redes: foram mais de 390 mil postagens em português no X, Facebook e Instagram. E a conversa avançou de verdade: o governo ampliou o acesso com remédios gratuitos na Farmácia Popular; a tecnologia ficou mais próxima (interesse em sensores de glicose e estudos sobre insulina semanal que deve entrar no Brasil na semana que vem); e até a novela Vale Tudo derrubou mitos ao falar do diagnóstico precoce de diabetes. Ainda assim, há muito a fazer.
Nesse cenário, a endocrinologista Joana Dantas, presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes – RJ e apoiadora do projeto, reforça porque a informação faz toda a diferença: “O Brasil é o sexto país do mundo em casos de diabetes e caminha para o quinto. Em tipo 1, mais de 93 mil crianças e adolescentes vivem com a condição. Sensores deveriam ser padrão para esses pacientes, além do acesso amplo a novas medicações que reduzem risco cardiovascular. A informação salva vidas, e também reduz desigualdade em saúde”.
Na questão do atendimento, ela reforça o aprendizado que teria evitado o susto da Renée e do filho: “Glicemia capilar tem que entrar no pacote dos ‘sinais vitais’ na emergência. É simples, rápido e pode evitar uma tragédia. Alguns serviços já adotam, mas o ideal é que seja universal”, reivindica.
É aí que a corrida entra como ponte. O Movimento Azul convida a cidade a ocupar a Lagoa Rodrigo de Freitas no próximo domingo, 9 de novembro, das 7h às 12h. Vai ter corrida, café da manhã, ioga, orientação médica e testes de glicemia gratuitos durante toda a manhã, com DJ para manter a energia lá em cima. Não é evento só para quem treina: é sobre bem-estar com utilidade pública, e vale caminhar, levar as crianças, chamar os amigos e aprender o passo a passo do cuidado. Se chover, vai de capa. Se bater a preguiça, lembra que é por saúde, a sua e a de quem você ama.
“Atividade física é pilar de prevenção e tratamento. Há evidência robusta mostrando que 150 minutos por semana, combinados com mudança de estilo de vida, reduzem em até 58% o risco de evoluir para diabetes tipo 2. Para quem já tem a condição, o exercício ajuda a controlar os picos pós-refeição e pode reduzir a necessidade de remédios ou insulina, com ganho direto de saúde cardiovascular”, destaca a endocrinologista.
A programação abre com corrida para todas as idades e níveis, às 7h30, com largada em frente ao Eu Rio Beach Club (Corte do Cantagalo). O trajeto faz uma volta completa pela Lagoa e retorna ao ponto de partida, onde será servido café da manhã aos participantes. Um diferencial necessário: o pelotão terá o apoio de corredores que vivem com diabetes, mostrando, na prática, que é possível conviver bem com a condição, e que o esporte é aliado no controle.
A economista Laura Rosa Marques, diagnosticada com diabetes tipo 1 ainda criança e hoje triatleta, transformou a disciplina em liberdade. “Aprendi que a diabetes tinha que ser minha companheira. A rotina é o que salva: mesma base de carboidrato nas refeições, treino planejado, ajuste de insulina conforme o dia. Quando entendi isso, ganhei autonomia e a doença virou minha melhor amiga”, conta.
A dúvida que sempre aparece para quem pratica esporte é direta: como alguém corre, inclusive maratonas, convivendo com diabetes? E como “sobrevive” sem carboidrato, o principal combustível? Não “sobrevive”: planeja. Laura não corre de improviso, corre com método e já completou 12 maratonas, correndo em ritmo de elite com seu “libre”, um sensor que mede sua taxa glicêmica em tempo real.
“Meu recorde é 3h07 em Colônia, e sigo nadando forte. Carboidrato não é vilão: é combustível. Em prova longa, uso géis ou bebidas no intervalo planejado, monitoro a glicose (sensor é vida) e combino tudo com meu endócrino. A endorfina vicia do jeito bom e o planejamento me deixa correr sem medo”.
E quando algo foge do roteiro? “Se a glicose despenca, não existe heroísmo: eu paro, meço e corrijo. Já passei por uma hipoglicemia na rua, do tipo que poderia ter terminado muito mal, e só não terminou porque alguém percebeu e me ajudou. Por isso repito: leigos também precisam reconhecer sinais. Informação na praça salva desconhecidos”.
Joana arremata com a dica para quem usa insulina e quer treinar com segurança. “Antes de treinar, meça a glicose. Ajuste a insulina de ação rápida do lanche (uma redução costuma ser necessária) e planeje a reposição: a cada 45–60 minutos, ingira cerca de 15 g de carboidrato. Pode ser gel, bebida esportiva ou banana. Sensores ajudam muito a decidir o momento certo e a evitar hipoglicemia. Nossos atletas performam bem com glicemias na faixa de 120 a 180 mg/dL”.
Entre a experiência de pista e o protocolo clínico, a mensagem é a mesma: é possível, e desejável, correr com planejamento, monitoramento e orientação. No domingo, a Lagoa, mais do que azul, veste atitude: transformar susto em cuidado compartilhado é exatamente o espírito do Movimento Azul.
“Educação em saúde muda destino: previne, diagnostica mais cedo e melhora o tratamento. E o Movimento Azul faz isso de um jeito que o Rio entende, com gente, sol, cuidado e movimento.”
Bora? Ainda há inscrições no Sympla Te vejo na Lagoa.
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Domingo, 9/11, das 7h às 12h
Local: Eu Rio Beach Club, Corte do Cantagalo
Programação:
7h15 — Aquecimento
7h30 — Corrida (volta na Lagoa)
9h — Aula de ioga
10h — Palestras (prevenção, nutrição e exercícios)
7h–12h — Orientação com médicos, testes de glicemia e DJ
