Cristo Redentor recebe iluminação azul em celebração aos 100 anos do GLOBO

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— Somos todos privilegiados em testemunhar este centenário do GLOBO, não somente por sua história, mas pela história de todos nós nela contida — disse padre Omar, reitor do santuário.

Quando O GLOBO foi lançado, em 29 de julho de 1925, o Morro do Corcovado ainda não tinha o Cristo Redentor. Considerado uma das sete maravilhas do mundo moderno, o monumento só começou a ser construído um ano depois.

Missa especial de Ação de Graças

Na manhã desta terça-feira, as comemorações da data começaram com uma missa especial de Ação de Graças na Igreja Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé, no Centro do Rio. Além de representantes de diferentes gerações da família Marinho, dona do Grupo Globo, a cerimônia reuniu jornalistas, políticos, artistas e empresários, além de funcionários e ex-funcionários que fizeram parte da trajetória do GLOBO. Padre Jorjão, que presidiu a missa especial, homenageou o veículo durante a homilia, destacando valores como o compromisso com a verdade, a credibilidade e a dedicação em olhar para o futuro.

Leia, na íntegra, a homilia de Padre Jorjão em homenagem ao GLOBO:

Ontem, dia do meu aniversário, minha família havia preparado um lanche com meus irmãos sacerdotes da paróquia. Quando foi preciso providenciar refrigerantes, minha irmã me pediu que fosse até a banca de jornal em frente à casa de nossa mãe. Ali, tive um pequeno choque de realidade. A banca, que um dia foi símbolo de acesso à informação, ainda vende jornais; mas eles já não ocupam o centro da cena. Estão lá, sim, mas discretos, ofuscados por outros produtos. O papel jornal resiste, quase como uma memória impressa de um tempo em que reinava absoluto.

Nos domingos de manhã, quando caminho para a missa das 10h, costumo passar por essa mesma banca às 9h, ainda fechada. Uma cena que, há poucos anos, seria impensável. Mas isso não quer dizer que os jornais deixaram de ser lidos. Na verdade, são lidos mais do que nunca, só que de outra forma. Minha família, que sempre assinou O GLOBO desde o tempo de meu pai, hoje o lê em formato digital. Os tempos mudaram. Os hábitos mudaram. A comunicação evoluiu. E O GLOBO também.

Sim, O GLOBO, fundado por Irineu Marinho e conduzido com coragem e genialidade por seu filho Roberto Marinho, já não está apenas nas bancas. Está no celular, no tablet, no site, nos aplicativos, nas redes sociais. A edição impressa ainda existe, e com prestígio, mas é a edição digital que hoje alcança o maior número de leitores em toda a sua história. E é preciso reconhecer: como tantas vezes em sua trajetória, O GLOBO foi pioneiro.

Hoje, o jornal é mais acessado do que nunca. Mas o segredo de sua longevidade não está apenas na tecnologia. Está na fidelidade à sua matéria-prima essencial: a comunicação confiável.

Vivemos em tempos em que até o dinheiro físico parece estar desaparecendo. Mas, como dizem os economistas, o que importa não é o papel-moeda, e sim o lastro que ele representa. Com a comunicação, acontece o mesmo: as formas mudam, mas a verdade continua sendo seu único valor duradouro.

E agora, já em plena era da inteligência artificial, enfrentamos o risco de que a mentira se apresente com aparência convincente, enquanto a verdade seja sufocada sob a máscara da falsidade. Por isso, mais do que nunca, o diferencial mais precioso de O GLOBO continua sendo aquele que o moldou desde sua primeira edição: o compromisso com o rigor, a responsabilidade, a escuta atenta e a fidelidade aos fatos…

Já em seu discurso inaugural, o Santo Padre Leão XIV justificava a escolha de seu nome como expressão de sua preocupação com os tempos que vivemos: uma nova era — a era da inteligência artificial. A tecnologia avança, os robôs escrevem, as máquinas interpretam. Mas a credibilidade continua sendo humana. Ela se constrói com integridade, discernimento e responsabilidade editorial. E, mais do que nunca, precisamos de faróis seguros neste vasto e imprevisível oceano digital. O GLOBO tem a oportunidade e a missão de ser esse farol: liderando com ética, ouvindo com atenção, apurando com rigor, esclarecendo com coragem. E, sobretudo, permanecendo fiel à sua origem popular e à sua vocação nacional.

Celebrar um centenário é, por isso mesmo, mais do que marcar uma data: é a oportunidade de revisitar a origem, reconhecer e valorizar a trajetória, e renovar a missão. Hoje, nesta celebração eucarística, rendemos graças a Deus por este jornal que, atravessando décadas, tecnologias e transformações, permanece fiel à sua vocação essencial: servir à sociedade com informação de qualidade.

Irineu Marinho (cujo nome significa “homem pacífico”) não foi pacífico no sentido da passividade ou do silêncio. Sua paz era feita de integridade e firmeza. Lembremos a antiga máxima latina: “Si vis pacem, para bellum”: se queres a paz, prepara-te para a guerra. E Irineu enfrentou suas batalhas: a dor da traição de um amigo, o desafio de começar algo novo depois desta amarga decepção, a coragem de deixar um legado duradouro. Sua vida foi breve, mas não inacabada.

Quando Irineu partiu, seu filho Roberto ainda era muito jovem. Poderia ter-se deixado vencer pela dor ou pelo peso da responsabilidade. Mas, ao contrário, assumiu com determinação o sonho do pai, e o ampliou. Fez dele um projeto de vida, transformando um ideal em realidade. E o fez com brilho e discrição, sem ruído, mas com firmeza. Seu nome, “Roberto”, de origem germânica, significa “brilhante”, “ilustre”, e assim ele foi: uma luz na comunicação, um construtor de credibilidade, um visionário que fez da palavra uma ponte com o futuro.

Roberto soube ouvir. Soube dar voz. Soube transformar leitores em ouvintes, e ouvintes em telespectadores. Mas acima de tudo, soube preservar aquilo que nem o tempo nem a tecnologia podem roubar: a confiança.

Hoje, celebramos O GLOBO como herdeiro dessa fidelidade.

Desde os éditos dos imperadores até os editais reais colados nas portas dos palácios ( onde se anunciava o nascimento de príncipes ou a morte de reis ), passando pela fumaça branca que proclama ao mundo a escolha de um novo Papa, a história sempre precisou de fontes confiáveis de informação. E o povo, quase sempre, soube reconhecê-las.

Assim também é com O GLOBO. Fundado há um século, em 1925, por Irineu Marinho, sua origem carrega em si um sinal de escuta: como sabemos, o nome do jornal foi escolhido pelo povo, em uma consulta popular. Desde o princípio, O Globo nasceu ouvindo.

Esse detalhe, aparentemente pequeno, é, na verdade, um símbolo. Ouvir é o primeiro ato da comunicação verdadeira. É também o primeiro gesto da fé: “Ouve, Israel!” – grita a Escritura. O mesmo imperativo ecoa na vocação do jornalismo que deseja servir à sociedade. Ouvir o povo, seus anseios, suas perguntas, suas dores. O Globo nasceu assim. E é isso que o torna, ainda hoje, tão profundamente necessário.

Ao assumir a obra de seu pai, o jovem Roberto Marinho não apenas a continuou. Ele entendeu que “os olhos da Comunicação devem sempre estar voltados para o futuro”.

No auge do rádio, quando a palavra reinava sozinha, O Globo ousou apostar na imagem. Fotografias passaram a dizer o indizível, como se o jornal proclamasse: “A verdade também se vê.” Era o pressentimento de que comunicar é tocar todos os sentidos. Hoje, ao olharmos para trás, reconhecemos ali uma escolha visionária; uma decisão que ajudou a moldar o estilo do jornal: direto, visual, acessível e, ao mesmo tempo, profundo.

Nos dias de hoje, em que a informação circula à velocidade da luz e as vozes se multiplicam ao ponto da confusão, o compromisso com a verdade tornou-se não apenas nobre, mas vital. O evangelho que ouvimos nesta liturgia nos recorda a essência da missão: “Não fostes vós que me escolhestes, fui eu que vos escolhi, para que deis fruto e o vosso fruto permaneça” (Jó 15,16). Frutos que permanecem são aqueles que nascem do amor à verdade. E é essa fidelidade que torna O Globo uma árvore enraizada na história brasileira.

A fidelidade à verdade, porém, não é neutra. Ela exige coragem. Coragem para contrariar interesses, para enfrentar poderosos, para não se vender à lógica fácil da popularidade ou do algoritmo. O jornal que quer ser ponte e não muro, como dizia o nosso querido Papa Francisco; luz e não ruído, precisa mais do que repórteres: precisa de testemunhas. E isso O Globo tem sido, ao longo de sua história.

A missão da imprensa digna não é outra senão esta: ser mensageira da paz, proclamadora de boas novas. Mas “boas novas” não são apenas boas notícias — são verdades que libertam. E nem sempre são confortáveis.

A carta de São Paulo aos Colossenses que acabamos de ler, em alguns versículos antes (2,6-15) nos dá uma última chave: “Permanecei enraizados em Cristo, firmes na fé… cuidai para que ninguém vos enrede com filosofias vãs.”

Trazendo isso ao nosso tempo, poderíamos dizer: cuidai para que ninguém vos enrede com fake news, com manipulações, com narrativas sem alma. A resistência à mentira é, hoje, um ato de fé e um serviço público. O jornalismo autêntico é também um antídoto espiritual contra a alienação.

Por tudo isso, celebramos hoje com reverência e esperança.

Reverência por uma história que nos formou. Esperança por um futuro que ainda precisa ser iluminado. O Globo chega aos 100 anos como uma instituição da República, uma trincheira da liberdade, um serviço ao povo brasileiro.

E como toda boa árvore, que dê ainda muitos frutos — frutos que permaneçam.

Por isso, nesta celebração, rendemos graças a Deus por estes 100 anos de O GLOBO.

E pedimos que o Espírito Santo, aquele que é chamado de Espírito da Verdade, continue inspirando os profissionais que hoje carregam essa missão.

Que o jornal de Irineu, de Roberto e da nossa querida Família Marinho — e por que não dizer de todos os profissionais que fazem parte da grande Família Globo (e de todos nós, seus leitores, afinal o Globo faz parte de nossa vida)? — permaneça fiel ao seu DNA, mas nunca deixe de se renovar.

Porque o tempo passa, as ferramentas mudam, mas a missão permanece: informar com responsabilidade, ouvir com atenção, publicar com coragem.

E que todos os que leem, ouvem e compartilham O GLOBO possam encontrar nele não apenas notícias, mas um farol de consciência e esperança.

Transcorridos cem anos, O GLOBO continua sendo mais que um jornal, é um capítulo vivo da história brasileira. Num mundo em busca de voz e rumo, que O GLOBO continue sendo bússola, não de certezas fáceis, mas de verdades responsáveis.

Vida longa ao jornal que, há cem anos, escuta o Brasil para contá-lo ao mundo. Que siga firme, onde houver a notícia; e onde for preciso coragem. E que sua luz, acesa há cem anos, continue a atravessar o tempo com a mesma fidelidade que o fez nascer. Amém.



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