Como conciliar o esporte e os primeiros ciclos menstruais?

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As mulheres têm vez mais destaque nos esportes. Todos ganham com esse avanço, mas é preciso que o universo esportivo também entenda as peculiaridades femininas. No caso das adolescentes, isso envolve um fator que ainda é tratado como tabu (mas não devia): a menstruação.
No Brasil, a idade média da menarca, ou seja, a primeira menstruação, é de 12 anos, e é super normal que ocorra entre os 9 e os 13 anos. Mas esse é apenas um capítulo da história.
De acordo com José Maria Soares Júnior, coordenador científico de ginecologia da Associação de Obstetrícia e Ginecologia do Estado de São Paulo (Sogesp) e chefe do Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Faculdade de Medicina da USP, por mais ou menos dois anos os ciclos das garotas seguem irregulares. A menstruação não tem data para vir, e quando desce, não se sabe exatamente quanto tempo vai durar.
— Mais de 60%, 70% delas podem apresentar uma menstruação irregular, que, na maioria dos casos, está relacionada à imaturidade do eixo hipotalâmico-hipofisário-ovariano. Ou seja, o corpo da menina está aprendendo a menstruar e esse aprendizado pode levar, em média, dois anos — explica.
Além disso, até 10% das meninas, segundoo ginecologista, podem ter síndrome dos ovários policísticos: nesses casos, elas ficam até três meses ou mais sem menstruar (se isso ocorrer é importante procurar um médico).
A discussão, que para muitos pode parecer secundária, é muito importante, de acordo com a médica Tathiana Parmigiano, ginecologista do Comitê Olímpico do Brasil desde 2011.
— Mais da metade das meninas larga o esporte durante a adolescência exatamente por causa da menstruação. Então, entender a menstruação e lidar com ela é importante até para não termos esse número super alarmante — afirma.
A ginecologista lembra que é muito comum que professores de educação física ou treinadores sejam homens. E existe toda uma preocupação em trazê-los para esse ambiente feminino, principalmente porque o esporte feminino está crescendo cada vez mais.
— Quem trabalha com essa faixa etária tem que entender que o corpo delas vai mudar nessa fase e que, eventualmente, elas vão menstruar. E que essa primeira menstruação ou os primeiros fluxos são muito imprevisíveis. Então, precisa ter um pouquinho desse cuidado, dessa atenção.
Tathiana cita exemplos de pacientes que enfrentaram dificuldades com professores que não as deixaram sair para ir ao banheiro durante a aula, sendo que precisam trocar o absorvente ou a menstruação tinha acabado de chegar. Outros casos envolvem garotas que praticam natação e o treinador não entende que elas não querem entrar e sair da água a todo momento (a pressão da água interrompe temporariamente o fluxo visível, mas ele volta a aparecer ao sair).
Assim, a médica reforça a necessidade que os profissionais sejam envolvidos. Outra dica é que, caso o professor ou treinador se sinta constrangido (ou as meninas se sintam envergonhadas de falar com ele) exista alguém a quem possam recorrer.
— É preciso ter alguém na equipe com quem elas consigam se comunicar. Nem que seja a professora da sala que intermedeie essa comunicação. Mas a garota tem que estar confortável caso não queira falar “professor, preciso ir ao banheiro trocar meu absorvente”— aconselha.
Por outro lado, o mercado também vem se adaptando a essa realidade. Tem as calcinhas com forro e até linhas de maiô para isso. Para a dor, existem adesivos reutilizáveis que esquentam (simulando a bolsinha de água quente).
Para adolescentes mais velhas, que já menstruam há um certo tempo, Tathiana conta que podem ser usados, sob orientação médica, reguladores do ciclo, que têm composição hormonal, mas não são contraceptivos, servindo para “que ela saiba quando vai sangrar, ajustando duração e volume do fluxo”.
Vergonha de que?
Para muitas garotas a menstruação ainda é algo meio vergonhoso, enquanto outras não têm nenhum problema. De qualquer forma, respeitando o bem-estar de cada uma, é importante normalizar o assunto.
— Eu já tive meninas que quando avisaram que ela “estava vazando”, disse: “Não, não, tudo bem, eu estou menstruada”. Muitas se posicionam. Uma vez, um cronometrista queria que uma paciente de 14 anos descesse do bloco, por ela estar sangrando. Ela falou, “não, não, só estou menstruada, tá tudo bem”. Existe essa menina, sabe? Bem resolvida, bem instruída. Não é vergonha, é normal, acontece. Vamos em frente — conta Tathiana.
No torneio de tênis de Wimbledon, que sempre exigiu uniforme todo branco, as mulheres agora podem usar shorts colorido por baixo da saia quando estão menstruadas. E elas têm pegado isso como uma causa, sem vergonha.
— Elas entendem de verdade que estão dando o exemplo para essa menina mais nova não deixar de fazer o que ela quer. Estou menstruada, e daí? Não deixei de treinar nem de competir. Tem uma outra mensagem que é mais importante: que é não desistir, não sair do esporte, não ver isso como um empecilho.
Primeira consulta
Até alguns anos, as garotas tinham sua primeira consulta no ginecologista só depois de iniciarem a vida sexual, ou se surgisse algum problema. Mas não é isso que as sociedades médicas aconselham.
Os especialistas reforçam a importância de que a primeira consulta ocorra na adolescência para que a menina seja orientada sobre sua saúde, para falar, justamente, sobre menstruação, puberdade, saúde reprodutiva, vacinação e prevenção de doenças.
Para José Maria Soares Júnior, o ginecologista já pode ser procurado quando começa o desenvolvimento dos caracteres sexuais secundários, ou seja, começa a crescer o peito, os pelos, para que elas recebam orientações sobre que vai acontecer com seu corpo.
— Depois que começa o desenvolvimento dos seios, em média, após dois anos ocorre a primeira menstruação. O ginecologista explica esse processo para as meninas, conversa com a adolescente sobre essa primeira menstruação, a parte fisiológica, isso a deixa mais tranquila — explica.
Essa consulta, geralmente, é acompanhada por um responsável e os exames não costumam ser invasivos a não ser que haja uma queixa ou problema específico.
— Acho que com a primeira menstruação vale muito a pena uma consulta. Essa primeira é exatamente para ela se sentir mulher e cuidada — afirma Tathiana.



Com informações da fonte
https://extra.globo.com/esporte/intercolegial/noticia/2025/09/como-conciliar-o-esporte-e-os-primeiros-ciclos-menstruais.ghtml

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