Uma mistura de verde, vermelho e amarelo se espalhou por ruas, praças e parques do Rio. Chama atenção na Praça Paris (Glória), nas avenidas Atlântica (Copacabana), João Luiz Alves e Portugal (Urca), ou em vias da Cidade Nova… Por vários cantos da cidade, amendoeiras estão fazendo a festa com suas folhas multicoloridas ainda nas árvores ou espalhadas pelo chão.
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O espetáculo acontece fora do tempo — normalmente, ocorre no outono. O biólogo Izar Aximoff, doutor em botânica pelo Jardim Botânico, explica que, este ano, a questão climática acabou afetando a rotina das árvores:
— Tivemos o verão mais seco da história. E, no meio do ano, algumas chuvas acima do normal. As árvores acabam respondendo meio diferente. Já registrei isso em outras espécies, além de amendoeiras.
As árvores que estão espalhando beleza pelo Rio têm uma faceta menos atraente: são consideradas vilãs da cena urbana. Como suas folhas obstruem bueiros e suas raízes provocam danos às calçadas, chegaram a ter o plantio proibido pela prefeitura em 1994. Em 2015, nova resolução municipal estabeleceu que deve ser dada preferência ao plantio de espécies nativas para a arborização urbana, a fim de valorizar a biodiversidade local, e a árvores que não causam os mesmos transtornos que as espécies exóticas.
Por e-mail, a Fundação Parques e Jardins (FPJ) informa que a amendoeira não é mais plantada em novos projetos. “A FPJ dá preferência à utilização de plantas nativas”, diz. “A fundação ressalta que o uso de espécies nativas é preferencial, mas não obrigatório”, conclui.
‘Um tapete lindo’
Contratempos e decisão do poder público à parte, a dona de casa Lucimar de Oliveira Campos, de 55 anos, moradora da Glória, só vê encanto no que a natureza proporciona:
— Sempre venho passear na Praça Paris. Gosto de paisagens bonitas, que ficam ainda mais lindas com as folhas coloridas das árvores formando um tapete lindo no chão.
Ainda tratando da questão climática, Aximoff lembra o veranico sem chuva da semana passada. E esclarece que, quando existe uma seca mais prolongada, principalmente no inverno, as árvores perdem as folhas para se proteger, porque há menos água no ambiente.
— É uma estratégia de defesa — diz o biólogo.
As cores das amendoeiras dão um ar de outono à Praça Paris
Márcia Foletto
O especialista esclarece ainda que, antes de caírem, as folhas perdem a capacidade de fazer a fotossíntese (processo em que plantas e outros organismos utilizam a luz solar para converter dióxido de carbono e água em açúcares, liberando o oxigênio como subproduto). Nesse momento, a clorofila — que dá a coloração verde — é transformada em nitrogênio e reabsorvida pela planta. As folhas passam, então, a ficar com aspecto amarelado e avermelhado.
— Os hormônios vegetais induzem a redução da clorofila, transformando-a em nitrogênio, que vai ser aproveitado pela própria árvore durante a brotação de novas folhas. A redução da clorofila permite que outros pigmentos, que são esses avermelhados, como os carotenos, fiquem mais à mostra. As folhas caem, mas logo que voltar a chover, entre aspas, a árvore identifica e dispara um mecanismo de produção de brotos de folhas novas. Aí, voltam as folhas verdes — conta, lembrando que normalmente a floração da amendoeira ocorre no verão, com dias quentes e de chuvas.
Segundo afirma um funcionário do município, não se sabe ao certo quantas amendoeiras existem hoje na cidade, já que a prefeitura ainda não realizou o Censo Arbóreo previsto no Plano Diretor de Arborização Urbana, aprovado em 2016.
— O que sabemos é que é uma das espécies mais presentes na cidade, como indicam levantamentos realizados em alguns bairros — diz ele.
Contrapeso nos navios
Engenheiro florestal aposentado da prefeitura, Luiz Pedreira diz que o Inventário da Cobertura Arbórea da cidade, de 2015, a partir de base de dados da Comlurb, indicava que 15% das árvores em áreas públicas da cidade eram amendoeiras. Em segundo lugar, com 12%, vinham as palmeiras (de várias espécies).
— É bem provável que a amendoeira ainda seja a árvore mais presente no que chamam de arborização urbana — supõe.
De maneira geral, as amendoeiras-da-praia (Terminalia catappa) vivem em torno de 50 anos. São árvores exóticas originárias do Sudeste da Ásia, da Índia e da Oceania — trazidas para o país no período da colonização. Seus troncos eram usados como contrapeso nos navios portugueses. Depois, as árvores (incluindo frutos e sementes) eram descartadas nas praias. Logo, a espécie se adaptou ao clima tropical e costeiro.
— Apesar não serem nativas do Brasil, as amendoeiras estão bem adaptadas ecologicamente e até servindo de alimento para animais. Há morcegos que se alimentam dos frutos da amendoeira,e algumas abelhas utilizam o néctar e pólen. É também uma árvore super importante para a sombra — explica Aximoff.
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Amendoeiras propiciam um espetáculo da natureza fora do tempo em ruas, praças e parques do Rio
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