Dois meses após deixar o Brasil, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) foi presa na Itália nesta terça-feira após ser incluída na lista vermelha da Interpol, o que a tornou procurada em 196 países. A prisão da parlamentar havisa sido determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), após ela ser condenada a uma pena de dez anos de reclsuão por falsidade ideológica e invasão do sistema eletrônico do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Especialistas ouvidos pelo GLOBO avaliam quais podem ser os próximos passos envolvendo a deputada, que tem passaporte italiano.
Segundo Zambelli, por ter a cidadania do país, ela seria “intocável” estando em território italiano, como ela chegou a afirmar logo após viajar para o exterior. A legislação da nação europeia, porém, admite a possibilidade de extradição de nacionais.
— Eu percebo que nós não temos mais justiça no Brasil, eu tenho cidadania italiana e eu nunca escondi. Como cidadã italiana, eu sou intocável na Itália. Ele (Alexandre de Moraes) não pode me extraditar de um país que eu sou cidadã — disse Zambelli em uma entrevista ao canal CNN Brasil.
O artigo 26 da constituição italiana, no entanto, diz ser possível a extradição de nacionais, quando prevista expressamente em convenções internacionais. Assinado em 1989, o Tratado de Extradição entre Brasil e a Itália permite essa possibilidade, ainda que a trate como facultativa, cabendo ao país europeu optar ou não pela extradição.
— O fato de a pessoa ser nacional possibilita a recusa, mas eles não têm o mesmo obstáculo constitucional que nós — explica o procurador e professor de Processo Penal da Universidade de São Paulo (USP) Andrey Borges de Mendonça, referindo-se à norma brasileira que proíbe a extradição de nacionais condenados no exterior.
Segundo Mendonça, ainda que a Itália venha a negar a extradição de Zambelli, ela deverá cumprir a pena no exterior por força das previsões do acordo de 1989. O procedimento seria o inverso do ocorrido com o ex-jogador de futebol Robinho, condenado à pena de nove anos de prisão por estupro pela Justiça italiana. Em 2024, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) homologou a sentença estrangeira contra o atleta, que começou a cumprir pena na Penitenciária II de Tremembé, em São Paulo.
— Se o país falar “não vou extraditar”, o Brasil transfere a sentença para lá. Impunidade certamente não vai acontecer. Ela vai ser extraditada ou será feita a homologação da sentença — explica o professor.
Um precedente é o caso do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado a 12 anos e sete meses de prisão por envolvimento no escândalo do mensalão pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato. Ele fugiu do Brasil em 2013, com o passaporte do irmão, mas acabou localizado e preso na Itália pela Interpol na cidade de Maranello, no Norte do país. Em seguida, o Brasil pediu a extradição dele, que tinha dupla cidadania:
— Todo mundo dizia na época que ele não poderia ser extraditado da Itália para o Brasil pois tinha cidadania dupla. Na verdade, estudando a legislação italiana e o histórico da Itália com países, vimos, sim, que era possível — disse o professor e procurador Vladimir Aras, em um vídeo publicado no Instagram no qual comparava os casos de Zambelli e Pizzolato.
Segundo Aras, o argumento da defesa do ex-diretor do Banco do Brasil se baseava na situação do sistema carcerário brasileiro. Na primeira instância, a solicitação de extradição foi negada pela Corte de Apelação de Bolonha. Mas o Brasil, assim como o Ministério Público da Itália, recorreu. Em fevereiro de 2015, a Corte de Cassação de Roma concedeu a extradição.
— O maior obstáculo foi a questão dos direitos humanos nas prisões. A Itália está submetida às normas da União Europeia. Se ela extraditar para um país que não respeita os direitos humanos, pode ser condenada na Corte Europeia — comenta Andrey Mendonça