Baianas além do Acarajé: Casa da Tia Ciata celebra ancestralidade feminina

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Rio de Janeiro – No dia 25 de novembro, o Brasil celebra o Dia Nacional da Baiana de Acarajé ( Lei nº 12.206, de 2010), uma das figuras mais emblemáticas da tradição afro-brasileira. Mas, apesar do imaginário popular associá-las principalmente ao tabuleiro de acarajé, as baianas são muito mais diversas e plurais. Há baianas de acarajé, de terreiro, de maracatu, de samba e cada uma com funções, simbologias e histórias próprias. Todas, porém, compartilham o mesmo alicerce. São guardiãs de saberes ancestrais e responsáveis por manter viva a memória cultural e religiosa da diáspora africana no Brasil.

A origem dessas figuras está profundamente ligada às mulheres negras que, desde o século XIX, circulavam pelas ruas das cidades brasileiras vendendo comidas, conduzindo rituais, preservando tradições e organizando redes de cuidado e resistência em meio à violência da escravidão e do pós-abolição. Na região que hoje conhecemos como Pequena África, no Centro do Rio de Janeiro, essas mulheres desempenharam papel central na formação cultural da cidade. O samba, as religiões de matriz africana, os rituais festivos, os mercados de rua e parte significativa da vida comunitária carioca foram articulados por elas.

É justamente nesse território que fica a Casa da Tia Ciata, referência nacional e símbolo maior da força dessas mulheres. No dia 25, a instituição convida para uma missa na Igreja de Santa Rita (Largo de Santa Rita, Centro), às 10h, em homenagem às baianas e à ancestralidade feminina negra. A matriarca Hilária Batista de Almeida (a lendária Tia Ciata) foi baiana de acarajé, sacerdotisa e articuladora cultural. Seu quintal foi berço do samba carioca, mas também um centro de acolhimento e poder.

“Tia Ciata deixa esse legado que nós compreendemos em forma de aprendizado e educação para o nosso futuro. É o Sankofa. Olhando para o passado, vendo o nosso presente para construir o nosso futuro. Um futuro que reverbera com a potência e a valorização da nossa cultura transmitida por ela”, afirma Gracy Mary Moreira, gestora da Organização dos Remanescentes da Tia Ciata (ORTC) e espaço cultural. Bisneta da matriarca

Baiana de Acarajé há 46 anos, Cecília de Jesus Nascimento (68), ou melhor, a Ciça do Acarajé, criou os 7 filhos com a profissão. E há 25 anos tem ponto fixo (acaraje_dacica) na Praça XV, sendo a mais antiga baiana de acarajé da Pequena África. “Eu consegui aquele ponto e hoje não me vejo mais em outro local. Há 25 anos eu fico na esquina da Praça XV, das 16h às 22h”, explica.

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A presença das baianas na história do Rio, porém, vai muito além do acarajé. De acordo com pesquisadoras do território da Pequena África, as baianas de terreiro carregam a liturgia e a força espiritual das casas tradicionais; as baianas de samba marcam presença nas escolas, mantendo a memória das tias e matriarcas; e, ainda menos conhecida, existe a tradição das baianas ligadas ao maracatu, que integram grupos, nações e cortejos de matriz africana que seguem vivos em diversas regiões do país, inclusive no Sudeste.

“Se tratando de cultura e tradição na Pequena África, precisamos pontuar que “baianas”  foram  as matriarcas afro-brasileiras. Além de lideranças religiosas, como Tia Ciata,  elas atuaram, especialmente entre 1850 e 1920, na região portuária do Rio de Janeiro como as grandes difusoras de uma ” África” marginalizada e silenciada pelas histórias tradicionais.  Além de construir redes de resistência e sobrevivências e laços de solidariedade, a “baianas” são a materialização das resistências cotidianas de quem trás em seu corpo as marcas da cultura e do sagrado”, explica Mariana Gino, historiadora, coordenadora de pesquisa do Viva Pequena África e diretora adjunta do CEAP.

No estado do Rio, o Gomeia Galpão Criativo, em Duque de Caxias, também guarda essa memória de forma ativa. A instituição que homenageia no nome o legado do babalorixá Joãozinho da Gomeia, é referência em cultura afro-brasileira e abriga grupos que dialogam com a tradição das baianas de maracatu, que são símbolos de realeza, espiritualidade e musicalidade. Essas baianas carregam estandartes, equilibram flores, conduzem cortejos e expressam, no corpo, a força de nações religiosas e culturais.

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“Para nós do Gomeia Galpão Criativo enquanto ponto de cultura, ter o maracatu dentro do Galpão é mais do que uma atividade artística. É uma atividade artística, cultural e educacional que reforça as tradições populares. É também um gesto de memória e continuidade, porque Caixas é uma cidade nordestina e negra e o maracatu reúne as duas coisas”, destaca Clara de Deus, diretora do Gomeia Galpão Criativo.

O lugar da baiana é de comando e guarda da ancestralidade. É o que nos mostra Ary Poscalli, Produtor e Musa da Nação de Maracatu Estrela Brilhante do Recife

“O maracatu foi fundado há mais de 200 anos e a tradição se mantém até hoje. Um dos personagens inseridos é a baiana rica de maracatu que se diferencia das baianas de escola de samba. É um  personagem de exuberância que atravessa décadas e usa penas, plumas, paetês,  pedrarias, e incorpora o travessismo, que significa incorporar o personagem feminino de dentro do maracatu e afirma o legado da beleza, do glamour LGBT.”

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Ao revelar a pluralidade das “baianas”, o 25 de novembro se transforma em convite à descoberta. Para além do tabuleiro, está um conjunto de personagens que moldou e seguem moldando a identidade cultural brasileira. 

Serviço

Casa da Tia Ciata convida para Missa em homenagem ao dia das Baianas

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Data e horário : 25 de novembro às 10:00h

Onde: Igreja de Santa Rita , Largo de Santa Rita, Centro



Com informações da fonte
https://vejario.abril.com.br/coluna/daniel-sampaio/baianas-acaraje/

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