Castro vê 'janela de oportunidade' após megaoperação na Penha e admite: ‘Somos o epicentro do problema no Brasil’

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Após a megaoperação que deixou 121 mortos — 117 suspeitos e quatro policiais — nos complexos do Alemão e da Penha, o governador Cláudio Castro (PL) afirma, em entrevista exclusiva ao GLOBO, que forneceu todos os instrumentos para a atuação correta das forças de segurança e promete cobrança dura caso fique provado que houve falhas no uso de câmeras corporais por parte dos agentes. Ele responsabiliza moradores pela retirada de corpos da área da Serra da Misericórdia, o que impediu que a perícia fosse feita no local. Na avaliação do governador, quando o assunto é segurança pública, o Rio é o “epicentro do problema do Brasil” e fala sobre as tratativas com autoridades dos Estados Unidos na área.
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Em depoimentos ao MPRJ sobre a megaoperação nos complexos da Penha e do Alemão, revelou-se que menos da metade dos agentes das forças de elite das polícias usou câmera nas fardas. O que aconteceu?
O que me foi passado pelos secretários é que todos os núcleos tinham câmeras. Inclusive, isso foi dito por eles ao ministro (do STF) Alexandre de Moraes. O que tenho que dar agora é total transparência para ser comprovado que isso é verdade. Se não for, quem cometeu o erro está aí para responder pelos seus atos. O papel do governador do Estado é comprar as câmeras, fazer com que elas tenham manutenção e estejam operacionais. Se alguém não cumpriu, a investigação está aí para comprovar o que aconteceu. Vou ser duro na cobrança para que tudo tenha sido feito corretamente, porque o instrumento foi dado a eles para fazerem tudo de forma correta.
Todos foram surpreendidos pela escalada no número de mortos na megaoperação. Como o senhor enfrentou aquilo na hora?
Olho primeiro para o número de pessoas que se renderam e estão respondendo ao devido processo legal. Foram 99 pessoas presas, o que mostra que foi uma operação para prender. O que chama a atenção da gente é drone jogando bomba, gente fortemente armada na mata… Quem, por 18 horas, não desistiu e trocou tiros com a polícia foram eles (os traficantes). O que tem que impressionar a gente é o grau da criminalidade, a potência bélica deles de enfrentarem o poder público, de enfrentarem o Estado.
Perícia: “Não houve porque tiraram os corpos de lá”
O MP relatou ao STF duas mortes atípicas na megaoperação: uma com tiro à curta distância e outra com decapitação. O que o senhor sabe sobre isso?
Não estou me metendo em nada, até porque, se eu estivesse, poderia ser acusado de prejudicar a investigação. Só acho que a gente tem que pegar a letra fria do que foi apresentado e contextualizar. Quem viu as cenas dos confrontos não consegue imaginar o policial atirando e depois indo decapitar alguém. É uma guerra. Não acredito que alguém tenha tido tempo ou tranquilidade para fazer isso. Acredito que foi o criminoso que fez para jogar a culpa na polícia.
O problema é que não houve perícia no local…
Não houve porque tiraram os corpos de lá. E não foi o Estado que tirou nem que colocou todo mundo de cueca para ter uma imagem forte. As imagens dos drones mostraram bem quem fez a fraude processual ali, e definitivamente não foi o Estado, muito pelo contrário. Os corpos começaram a ser retirados pelos moradores por volta de meia-noite.
Mas o Estado iria à mata fazer a perícia?
Iria. Já estava programado.
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Planos: “Ganhamos uma janela de oportunidade”
Pós-operação e diante da repercussão, quais são os planos?
Ganhamos uma janela de oportunidade e entendemos três grandes pilares que precisamos enfrentar. O primeiro é a questão das armas: vamos trabalhar na retirada dessas armas das comunidades. O segundo é a questão das barricadas, que temos um projeto a ser lançado. E o terceiro é o sequestro da economia (do crime), sobre o qual a Polícia Civil tem intensificado as investigações.
Como será a retirada dessas barricadas?
A ideia é a que gente retire (das ruas) o material das barricadas. Não será só desobstruir o acesso, é retirar dali construções, carros, cabos e restos de madeira usados nessas obstruções. Por isso, as prefeituras serão importantes, sobretudo, com caminhões para tirar esse material. Valas (abertas pelos bandidos) também serão aterradas. Vamos colocar concreto na mesma hora. O Estado provê os kits de demolição, de corte etc. Vamos começar com 50 equipamentos e, em seguida, aumentaremos até conseguir tirar tudo. Vamos utilizar também maquinário de contratos que temos com diferentes secretarias.
Sobre o PL Antifacção em debate no Congresso, como o senhor avalia o recuo em relação à comparação das facções criminosas com o terrorismo?
Continuo achando que é terrorismo. A minha posição é essa. Mas, além do que acho, tem aquilo que é possível. Não adianta inflamar um debate desses com a nossa posição e impedir que saia um texto que possa ser um instrumento para combater o crime. Eu prefiro, nesse debate, ser muito mais propositivo do que tentar impor o que penso. Se não der para chamar de terrorismo, vamos achar os instrumentos necessários para fazermos o verdadeiro enfrentamento.
Quanto a enquadrar as facções como terroristas, alguns acreditam numa possível interferência internacional no Brasil…
Tirando a Primeira e a Segunda Guerra, eu não me lembro de uma nação de dimensões continentais, com uma democracia consolidada e instituições fortes, ter sido invadida por ninguém. Isso me parece um discurso demagógico. Com a classificação de terrorismo, teríamos uma grande oportunidade de fazer o verdadeiro follow the money, de seguir o dinheiro e diminuir o potencial financeiro das facções, que é o que financia o poder bélico.
Colaboração internacional: “Mostramos que cerca de 80% das armas apreendidas no Rio são montadas aqui a partir dessas peças”
O senhor solicitou colaboração dos EUA no enfrentamento ao tráfico aqui no Rio?
No quesito armamento, falamos dos fuzis Frankenstein, porque eles fizeram uma restrição à venda de armas prontas, mas não restringiram a venda de peças. Mostramos que cerca de 80% das armas apreendidas no Rio são montadas aqui a partir dessas peças. Nada foi para solicitar que os Estados Unidos entrassem aqui,isso é uma bobagem. Fomos alertar sobre problemas reais do Rio e falar que só não vender a arma pronta não resolve o problema. Esse diálogo não transgride, em nada, a questão da soberania nacional. Somos o epicentro do problema no Brasil.
Na recente transferência de presos do Rio para presídios federais, o Ministério da Justiça criticou dizendo que o governo do Rio divulgou a transferência dos presos do CV para o sistema federal antes de ela acabar. Como o senhor responde a essas críticas?
A primeira que divulgou a operação foi a Malu Gaspar, do jornal O Globo. E, na matéria, está dito que a transferência foi feita pelo governo Lula. Então, não fomos nós que divulgamos, foram eles próprios que vazaram. Acho que não tem bobo aqui. Todo mundo sabe que, se vazou e falou o nome deles, faturando para eles, não fomos nós que vazamos. Depois que se tornou público, aí já não é mais divulgar, é prestar contas.
Em outubro, mostramos que um documento interno da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) apontava que o Beira-Mar ainda exerce influência nos presídios federais. A gente não vai conseguir realmente isolar os presos dentro do nosso próprio estado?
Trabalho com as armas que tenho. Toda vez que mando um criminoso para Bangu I, a VEP recebe uma enxurrada de petições mandando eu explicar exatamente o motivo dessa transferência. E, não poucas vezes, é determinado que o Estado o tire de lá e o leve de volta para Bangu III. Como também já foi determinado várias vezes que se retire do sistema federal e traga de volta para cá. Tenho que seguir o que está disponível. E o que tenho disponível para minimizar, mitigar e combater é mandar para o presídio federal, que é o terror desses criminosos.



Com informações da fonte
https://extra.globo.com/rio/noticia/2025/11/castro-ve-janela-de-oportunidade-apos-megaoperacao-na-penha-e-admite-somos-o-epicentro-do-problema-no-brasil.ghtml

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