Em um episódio que mistura pompa militar e escândalo financeiro, a Força Aérea Brasileira (FAB) condecorou com a Medalha Santos Dumont o empresário Fernando Cavalcanti — investigado pela Polícia Federal e pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS por suspeita de envolvimento em um esquema bilionário de fraudes contra aposentados.
A honraria, uma das mais altas da Aeronáutica, foi entregue em 4 de setembro, apenas oito dias antes da deflagração da Operação Cambota, desdobramento da Operação Sem Desconto, que investiga o desvio de benefícios previdenciários. A FAB afirma que a medalha foi concedida em 25 de junho, antes da investigação, e se recusa a comentar o caso. A condecoração, porém, já carrega o peso do constrangimento público.
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Cavalcanti dedicou a medalha à sua empresa de consultoria, a Valestrá, que até junho se chamava NW Consultoria — nome que remetia ao ex-sócio Nelson Wilians, também investigado no esquema. A empresa, curiosamente, não tem qualquer atuação no setor aeronáutico.
Segundo documentos obtidos pela CPI, Cavalcanti teria recebido uma transferência de R$ 200 mil de Maurício Camisotti, apontado como um dos principais operadores da fraude. Camisotti é suspeito de comandar associações que descontavam ilegalmente valores de aposentadorias e pensões.
Ferrari, relógios e vinhos de luxo: patrimônio sob suspeita
Durante a operação da PF, foram apreendidos na casa e em um shopping de Brasília bens de luxo pertencentes ao empresário, incluindo uma réplica de carro de Fórmula 1, uma Ferrari F8 avaliada em mais de R$ 4 milhões, relógios de grife e vinhos estimados em R$ 7 milhões.
Quatro requerimentos da CPI pediram sua convocação, citando patrimônio incompatível com a renda declarada. Em depoimento nesta segunda-feira (6), Cavalcanti negou envolvimento com o esquema e afirmou que os bens foram adquiridos legalmente, alguns ainda em financiamento.
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Silêncio na CPI e habeas corpus no STF
Amparado por habeas corpus concedido pelo ministro Luiz Fux, Cavalcanti optou por permanecer em silêncio durante parte do depoimento à CPI, após responder apenas ao relator. Ele negou ser “laranja” ou beneficiário do esquema e disse desconhecer as atividades ilícitas dos ex-sócios.
A condecoração, agora cercada por suspeitas, expõe a FAB a constrangimento público e levanta questionamentos sobre os critérios de escolha para uma das mais prestigiadas medalhas da Aeronáutica.