Num gesto que causou perplexidade, representantes da comunidade científica brasileira se mobilizaram contra o Projeto de Lei 330/2022, que propõe criminalizar práticas como falsificação de dados, plágio e manipulação de resultados em pesquisas. A proposta prevê penas de três a cinco anos de prisão, além de multa, para condutas fraudulentas. O pedido por blindagem contra a criminalização levanta questionamentos sobre a real disposição da ciência institucionalizada em enfrentar a desinformação e proteger sua credibilidade.
Durante audiência pública realizada pela Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT) do Senado, no último dia 24, conduzida pela senadora Teresa Leitão (PT-PE), especialistas alegaram que o projeto pode desestimular a pesquisa, fomentar a judicialização excessiva e comprometer a liberdade acadêmica. A presidente da Academia Brasileira de Ciências, Helena Bonciani Nader, reconheceu a legitimidade da proposta, mas afirmou que a solução legislativa apresentada não é eficaz. Segundo ela, a ciência lida com incertezas e hipóteses, e erros metodológicos não devem ser tratados como crimes.
Nader defendeu o fortalecimento de mecanismos já existentes, como a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal, que regulam e fiscalizam a integridade científica no país. Ela alertou que a criminalização pode inibir a inovação e instalar um clima de medo na comunidade científica, prejudicando o avanço da ciência brasileira.
O secretário substituto do Ministério da Ciência e Tecnologia, Osvaldo Luiz Leal de Moraes, destacou que o método científico é essencial para distinguir ciência legítima de charlatanismo, e colocou a culpa no mau uso da informação científica que ocorre fora do ambiente acadêmico. Já Olival Freire Júnior, presidente substituto do CNPq, também alertou para o risco de judicialização excessiva e defendeu a valorização da ética por meio da educação e da autorregulação.
Denise Pires, presidente da Capes, reforçou que o Brasil é referência internacional em integridade científica e que o projeto pode comprometer essa reputação. Samuel Goldenberg, da SBPC, foi mais enfático: alertou que a criminalização da ciência pode distorcer o debate público e alimentar discursos de negação.
A audiência contou com a participação de representantes da UnB, Fiocruz, Finep e ANPG, que também expressaram preocupações sobre os efeitos do projeto.