A atuação de oito agentes do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) durante a Operação Caixinha, realizada no Complexo do Alemão em 15 de janeiro, é investigada pela Corregedoria da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Câmeras corporais dos policiais registraram o grupo vasculhando cômodos e escolhendo itens, como perfumes, roupas e sapatos. “Estou precisando de um Playstation. Se alguém encontrar, me avisa que eu jogo tudo fora”, disse um.
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Câmera corporal flagra PMs furtando itens de casa em comunidade
Na filmagem, as mochilas seguem sendo preenchidas com roupas de grife, tênis e fragrâncias, enquanto os policiais comentam sobre outros bens de consumo. “Se estivesse com a viatura, levava a JBL”, chega a dizer um deles, em referência a uma caixa de som no local.
Na mesma tarde da incursão, às 14h09, o Ministério Público recebeu, via WhatsApp, uma denúncia encaminhada pelo promotor de plantão Victor Souza Maldonado de Carvalho Miceli e registrada internamente sob o número 2025566574. A gravação captada pela câmera corporal de um dos agentes foi anexada à mensagem.
A operação, que mirava a “caixinha” do Comando Vermelho (CV), a maior facção criminosa do estado, tinha como um de seus alvos o traficante Fhillip da Silva Gregório, o Professor, considerado um dos principais fornecedores de armas da quadrilha e recluso há anos no Alemão. Ele acabou morrendo em junho, com um tiro na cabeça, em um suposto suicídio.
Todos os flagrantes só existem porque um dos cabos do Bope presentes na incursão, Leandro Silva Pereira dos Santos, responsável pela câmera, aparentemente esqueceu de desligar o equipamento. Em determinado momento, um morador chega a perguntar se eles estavam filmando, mas recebe um “não” como resposta. Nas imagens, porém, fica evidente que o próprio agente também participou dos furtos, produzindo a prova que agora sustenta a investigação da Corregedoria contra ele e o restante do grupo de elite da PM fluminense.
No interior da casa invadida — segundo a apuração sem mandado judicial que autorizasse o acesso —, o comportamento dos policiais destoava completamente do objetivo oficial da ação. Logo na entrada, um dos agentes abriu a geladeira, pegou uma lata de Red Bull, deu dois goles e dividiu com os amigos. Em seguida, o grupo de militares armados com fuzis percorreu todos os cômodos em uma primeira inspeção, abrindo portas de armários, gavetas e baús. Todos eles mantinham mochilas nas costas. Nesse primeiro momento, porém, nenhum deles praticou furto.
Após o reconhecimento de território, os PMs voltaram à sala e conversaram com um casal de moradores, mantendo ar de normalidade. Na sequência, os agentes passaram a se movimentar: parte ficou no térreo, conversando com os donos de casa, enquanto outros subiram de volta aos quartos.
No andar de cima, os policiais deixaram os fuzis apoiados sobre móveis e foram direto aos pontos já observados na ronda inicial. Roupas foram retiradas dos cabides e analisadas peça por peça, camisas de grife separadas, e até gavetas com roupas íntimas foram abertas, com itens de marca sendo observados. A filmagem mostra as mochilas sendo empregadas para receber os achados, numa ação colaborativa em que um abria a bolsa nas costas do outro para facilitar a coleta. “Aqui as roupas não são de lojinha, são artigos de loja”, comentou um deles.
No vídeo, os policiais também discutem sobre tênis de corrida, destacando os Nike Shox, comentando as molas, o design, as cores e a beleza dos calçados. Em certo momento, um deles pegou um par e perguntou: “É de correr?”. Outro respondeu de imediato: “Nenhum desses aqui é para correr”. A conversa segue em tom de entusiasmo: “Tem número 43?”, questiona um agente, recebendo um “Não sei” como resposta. Em seguida, outro resumiu o valor dos modelos analisados: “É tudo tênis que custa mais de dois mil contos”.
Depois de analisar sapatos, os policiais do Bope experimentaram perfumes importados, borrifando no pulso, cheirando e devolvendo os frascos que não agradavam. Entre os preferidos estavam o 212 VIP Black, vendido a R$ 600, e o 1 Million, de R$ 450.