O Brasil assistiu, no dia 28 de agosto, ao desbaratamento de um esquema bilionário de lavagem de dinheiro e fraudes no setor de combustíveis. A operação contra as facções criminosas foi deflagrada a partir de uma atuação conjunta de vários órgãos federais e estaduais, sendo devidamente autorizada pelo Judiciário. Na quinta-feira, uma nova operação voltou a mirar negócios que, segundo as autoridades, são usados para lavar dinheiro do Primeiro Comando da Capital (PCC).
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Além de números grandiosos, com o bloqueio e o sequestro de bilhões de reais em bens e valores, ambas as operações deixaram evidente que o enfrentamento da criminalidade no país só será efetivo a partir de cooperação e integração entre os diferentes órgãos que compõem o sistema de Justiça. O debate sobre a união de esforços tem sido feito há alguns meses, desde que foi apresentada a PEC da Segurança Pública.
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A Emenda Constitucional ainda está em discussão no Congresso Nacional, mas as ações revelaram, a despeito da descrença de muitos, a capacidade do Estado brasileiro de se organizar para combater o crime organizado — hoje, um flagelo global. E mais: foi dado o “caminho das pedras” para asfixiar as facções que já têm braços transnacionais.
Hoje, a atuação ostensiva das forças policiais já não é medida suficiente para impedir o avanço da criminalidade. Por isso, o ministro Ricardo Lewandowski criou o Núcleo de Combate ao Crime Organizado, com o objetivo de promover a integração entre os órgãos do governo federal e demais instituições para o enfrentamento de grupos criminosos.
A ideia central é mapear, sistematizar e analisar informações sobre a atuação do crime nos mais variados setores, além de dar mais agilidade a processos de identificação e confisco de bens. Um laboratório do que se almeja com a PEC da Segurança Pública.
Em fevereiro, a primeira reunião do núcleo foi justamente sobre o crime organizado no setor de combustíveis. Naquele dia, por determinação do ministro Lewandowski, foi aberto um inquérito na PF para investigar e desarticular a infiltração criminosa no setor.
Nesse contexto de integração, as operações Quasar, Tank e Carbono Oculto surgiram do trabalho da Receita Federal, que identificou movimentações financeiras atípicas. Os investigadores seguiram o caminho do dinheiro (follow the money), conseguiram bloquear o patrimônio e estrangular financeiramente os grupos criminosos. Não foi preciso “tiro, porrada e bomba” para fazer bom combate.
A partir de agora, os investigados terão assegurado o devido processo legal e o direito à ampla defesa para chegar à conclusão sobre quem são os verdadeiramente envolvidos.
Com um sofisticado trabalho de inteligência, a ampla cooperação institucional foi capaz de desmantelar um megaesquema em toda a cadeia do setor de combustíveis. As investigações revelaram que a organização lavava o dinheiro proveniente do crime e, ao mesmo tempo, obtinha lucros com sonegação fiscal e adulteração de produtos. As operações financeiras eram realizadas por meio de fintechs para dificultar o rastreamento dos recursos, e fundos de investimentos eram usados para impedir a identificação dos reais beneficiários do esquema.
Ato contínuo, o Congresso Nacional deu um passo crucial para asfixiar financeiramente o crime organizado, com o avanço, no Senado, do Projeto de Lei do Devedor Contumaz.
A aprovação da proposta — cujo debate foi enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal — dará ao país a possibilidade de separar as empresas que deixam de pagar impostos por dificuldades econômicas reais das que usam a inadimplência reiterada como estratégia de negócios.
A megaoperação, uma das maiores ofensivas contra o crime organizado, deixa uma lição de política de segurança pública ao país. O Estado brasileiro precisa investir, cada vez mais, no tripé inteligência, análise de risco e integração institucional.
*Marcus Vinícius Furtado Coelho, advogado e presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB, foi presidente nacional da instituição